Eu estava em Três Rios, uma cidade pequena do interior do estado do Rio. Sabe como é, a gente arruma namorada e dali a um tempo começa a necessidade de pegar o carro. Embora eu fizesse auto escola desde os dezesseis anos, dirigir mesmo, meeeesmo, só depois que eu casei. E a explicação para este fato reside justamente nessa história que vou contar agora:
Sou o sobrevivente de uma perseguição sanguinária que começou assim: Eu resolvi sair com a minha namoradinha na época e peguei o Monza do meu pai emprestado. Bom, eu não sabia dirigir direito, tava aprendendo. Na verdade, nem muita vontade de dirigir eu tinha. Era mais necessidade, pois você começa a sair com a namorada, quer voltar tarde da noite e fica perigoso. Tá, vamos parar com a hipocrisia. Eu queria é dar uns amassos mais profissionais e não dava pra dar na rua.
Motel tava fora de cogitação. Por que? Outro dia, em mais um caso gump eu conto essa.
Então eu peguei o carro e nós saímos. Eu todo garotão, no carrão do meu pai. Passei na casa dela e fomos passear. Tá, tá… Não fomos passear nada. Fomos direto para a beira-rio dar um amasso. A tal da beira-rio era uma espécie de praia lá de Três Rios, uma cidade sem praia. Assim, o prefeito mandou fazer um calçadão em volta das margens do rio que corta a cidade. Um bom lugar para os namorados ficarem. Não era o motel das estrelas, que fica no mirante, mas chegar até lá envolvia uma certa logística no relacionamento, pois ficaria claro que eu queria passar o rodo, e a coisa tinha que ser mais devagar, ou ao menos, mais etílica.
O segundo motivo que que me fazia não ir até o motel… Aliás, mirante de Três Rios, é que tinha uma rampa desgraçada de subida, quase vertical, e eu não sabia fazer ladeira direito. Imagina só o carro descendo despinguelado de ré aquela pirambeira com a mulher gritando na minha orelha… Ia ser trágico.
Ficamos ali na beira-rio, que era fácil de ir, pois é só ir reto em quase qualquer rua da cidade que você cai lá. Fácil pra quem tá aprendendo a dirigir e não tem as manhas ainda. Ficamos um pouco, tomamos uns refris, comemos uns hamburgueres, demos muitos amassos e tava na hora de levar ela em casa.
Então eu arrumei os óculos, sentei no banco do carro, arrumei o retrovisor, (cheio de técnica, parecia até o Schumacker) e saímos em direção à casa dela.
Foi tudo bem, eu estava mesmo dirigindo bem pra dedéu. Todo confiante.
Deixei a J* em casa e comecei a voltar pra casa. Na volta, resolvi esticar o percurso para dar uma treinadinha a mais. Assim, passei pela rodoviária velha e ao fazer uma curva, percebi que quase joguei uma brasília creme que vinha me ultrapassando num poste. Aquela fechadinha mané, que dá uma raiva do caralho. O mané vai abrindo, abrindo, abrindo na curva e atravessa as pistas sem olhar os carros em volta. O cara socou o “mãozão” na buzina e eu nem esquentei. Daí comecei a ver que o cara acendeu o farol alto atrás de mim.
Comecei a me preocupar quando, pelo retrovisor, vi o cara colocar uma coisa preta para fora da janela. Julguei que era um revólver, mas certeza eu tive mesmo quando aquela merda disparou. Téc! Era 38.
Egraçado como o barulho do 38 é estalado. Parece uma bombinha de São João.
Eu soquei o pé no acelerador e a brasília sinistra atrás. Ela era creeme, com vidro fumê. Parecia ter algum adesivo no vidro mas não lembro direito por motivos óbvios.
Então era eu, me cagando todo num Monza velho e uma brasília creme fumê com um maníaco assassino portando um trabuco para fora do carro atrás de mim.
Eu comecei a fugir com o carro e o maluco no vácuo. Subi na esquina da minha avó e virei em direção à linha do trem. A porra da brasília assassina atrás. Na cola. Eu tentava dar uns golpes de volante pra ele não fazer mira. Não sei se dava certo, mas ele só atirou para cima.
Peguei em direção à cidade de Paraíba do Sul. O cara atrás. Eu pisava o máximo que dava no Monza e quando cheguei na estrada, com o * na mão, duplamente, um por estar numa estrada de noite, sem carteira, sem saber dirigir direito, outro pelo maníaco querendo me matar.
Mas na estrada, meti o pé e joguei a quinta pela primeira vez na vida. Eu sabia que fusca não tem quinta, e como fusca e brasília são carros da mesma família, ela também não devia ter.
E não tinha. Por isso, ficou para trás. Eu dei uma boa distância e quando achei que já tava bem longe dela, depois de uma curvona, joguei o carro numa mínuscula entrada no meio do mato e árvores que havia de acesso a umas casinhas da beira da estrada. Desliguei o carro e apaguei os faróis. Fiquei esperando. Com medo.
O coração parece que ia sair pela boca.
Então uns dez segundos depois, a brasília passou igual a uma bala na estrada bem atrás de mim. Passou voada.
O cara queria mesmo me matar. Dei um tempo ali no mato. O silêncio da noite preencheu o espaço e ouvi os grilos. A noite estava bonita e escura.
Tornei a ligar o carro e voltei voado para a casa da minha vó. Depois disso não dirigi de novo até conhecer a Nivea.
Perrengue, né?