
Eu devia ter escrito sobre isso antes. Mas detesto revelar segredos, então dei um tempo pra todo mundo ler, ver ou mesmo ouvir do amigo na mesa do bar.
Nada me irrita mais do que ver certos estelionatos travestidos de ciência. O segredo, um livro que virou filme, saiu na capa das revistas semanais, virou brinde na assinatura de jornal, e se bobear vira até programa de auditório em algum canal aberto é um clássico exemplo do 171 da melhor qualidade.
O segredo, que a esta altura não é segredo mais pra ninguém, é uma literatura de auto-ajuda travestida com uma aura de cientificismo new age de quinta categoria que usa palavras como “Física Quântica” (coisa que menos de 0,997% da população sabe o que é, mas pela sonoridade, 99,99% da população acha que deve levar a sério) e uma aura de mistério (a começar pelo nome, afinal, todo mundo quer saber algum segredo) e pela programação visual cuidadosamente bolada para parecer antiga, para atrelar a ideia de um segredo, uma conspiração, com nomes e personalidades que evoquem sucesso e genialidade no passado. Algo historicamente conspiratório como só Dan Brown poderia pensar.
Mas o fato é que isso tudo é um monte de baboseiras para vender livro de auto-ajuda. A menos que você ganhe o livro de alguém, porque neste caso, se você ganhou, logo não comprou. Se não comprou, em tese não poderia ser auto-ajuda, e sim ajuda externa. Então, na melhor das hipóteses, é um livro de auto-ajuda ou só de ajuda. Isso partindo do pressuposto que o livro vai te ajudar em alguma coisa além de ficar mais pobre.
Vamos falar francamente: Não há nada, absolutamente nada neste livro que faça dele algo minimamente científico como ele pretensiosamente faz crer o leitor. Isso é crença. Como a religião. Crer no segredo é a mesma coisa que crer em Deus, em Buda, na Força jedi ou no monstro do espaguete. Se te ajuda, ótimo. Mas ciência não é.
O problema é quando a mina de ouro é tão boa que começa a infundir aos quatro cantos a ideia de que isso é sério. E as revistas, muitas delas pegando a carona na febre do troço dão isso como fato comprovado.
Pensamento positivo é bom. Quando você está pré-disposto a alguma coisa, sua mente fica tentando achar maneiras de viabilizar aquilo, e de fato se há um jeito, a coisa acontece. O problema é que as pessoas acabam atribuindo a um livro, que por sua vez atribui a um suposto segredo de um conhecimento antigo que se explica através da física quântica uma coisa que está dentro da pessoa.
“Querer é poder” é um provérbio tão sábio quanto velho e se isto é um fato, não necessita de comprovação científica nem chancela ou aura de mistério. Todo o resto é a cobertura do bolo. É coisa para te empurrar livro e filme. Te fazer consumir. E sendo isso um enorme sucesso, de fato ele faz as pessoas que trabalham na publicação e no filme felizes e ricas. Então, não nego que em certos aspectos, realmente funciona. È como o livro “Como vencer na vida sem fazer força”, que tem escrito dentro apenas uma frase: “vendendo este livro para manés como você”. Funciona.
Mas pelo amor de Deus, não me venha dizer que isso é científico porque não é. A coisa do rocambolescamento científico para empurrar a trolha nos ignorantes não se restringe ao segredo e outros fenômenos editoriais passageiros.
Outro dia conheci um vendedor de colchões magnéticos que alegava sob um monte de frases de aparência científica (mas que à primeira pergunta revelavam o poço sem fim de ignorância do próprio vendedor) que o colchão operava um verdadeiro milagre, melhorando TUDO e curando TODA E QUALQUER doença que você por ventura tivesse. Incluindo o câncer. Isso mesmo, câncer!
Isso graças às (nas palavras dele) células magnéticas de alta ação, partículas infravermelhas de emissão longa e antenas energéticas que emitem uma radiação que captam na energia da Terra e canalizam para seu corpo. Além disso, o colchão era revestido com um tipo de tecido especial que libera uma energia no organismo que induz liberação de Vitamina D no sangue. Assim, o colchão ainda era um excelente antioxidante que previne até osteoporose. O colchão era caro, mas parece uma pechincha para algo que combate até o câncer! Eu dei corda até não aguentar mais. Pensei em gravar com meu celular a conversa de cerca-lourenço do vendedor. O caô mais tosco do universo. Era só o que faltava. Colchão infravermelho vitaminado.
Mas tudo isso é GOLPE. G-O-L-P-E, 171, estelionato do mais safado.
Sem falar nessas coisas que são verdadeiras máquinas de fazer chatos, como Amway, Dorizzi, Forever, MiltiMarketing, Bionutri, e tantas outras criações de marketing de rede. O Brasil devido a sua forte característica de venda direta (3º maior mercado mundial) é um grande mercado potencial para o marketing de rede, o que indica que os chatos vão proliferar ainda mais.
Me desculpa se você vende uma merda dessa aí, mas se vende, é bem provável que você seja um chato. Eu sei, eu sei. Ninguém vai te falar isso. Mas as pessoas vão correr de você e fugirão ante a sua presença como o diabo foge da cruz. Você vai virar (ou já é e nem notou) um “homem adstringente”. Aquele que desmancha grupinho. Se você chega numa rodinha e sai cada um para um lado, não dá outra. Pare de vender essas lixaradas!
Digo isso porque nunca, NUNCA na minha vida conheci alguém que pertença a uma coisa de marketing de rede sem ser chato e inconveniente.
Puts, marketing de rede é uma merda, a desgraça do mundo moderno. Ninguém merece esses caras dizendo pra você que se você consumir uma merda lá feita de babosa vai viver tantos anos a mais, porque isso porque aquilo… Ou vai emagrecer, ou vai ficar rico e bonito, ou tudo isso junto.
No fundo, todo o papo, a conversa de lucros extraordinários e tudo mais, encobre uma rede de pressões para o cara bater uma meta e arregimentar novos chatos. Para tal, ele é incitado (praticamente lavagem cerebral) a investir em visual, em ostentar uma pretensa riqueza (mesmo quando não pode, ou não deve) para atrair mais bobos, digo, mais adeptos.
Voltando ao lance do segredo. O Segredo é algo que funciona, eu reconheço. Só que funcionar não significa ser científico. Eu por exemplo, logo que vi aquela merda (num Dvd piratão) consegui perceber esta diferença, mas mesmo assim dei uma chance e mentalizei todos os dias querendo um apartamento, fato absolutamente fora as minhas possibilidades financeiras. De fato, quase que magicamente, eu consegui arrumar um apartamento que eu podia pagar. Só que ele tem uma varanda bem menor do que eu queria. Culpa da Nivea, que mentalizou querendo um apê de “varandinha”…
Deu mole. Deveria ter mentalizado um apê de varandão…