O padeiro que estava bêbado demais para morrer

Charles John Joughin, nascido em Cheshire, condado no noroeste da Inglaterra, tinha 33 anos quando subiu no RMS Titanic para exercer o seu maior talento entre os membros mais requintados da alta sociedade a bordo: fazer pães, massas, bolos e pastéis. Ele foi escaldado par ser o padeiro-chefe por já ter experiência em barcos e navios – desde os 11 anos de idade, em 1889, já embarcava em navio. Além disso, Theodore e Richard, seus irmãos mais velhos, eram membros ativos da Marinha e ligação direta do irmão para qualquer informação sobre os perigos no mar britânico. Com todo amparo para a vida no mar, foi incluído em inúmeras listas de tripulantes, sempre como o padeiro da ocasião.
A vida como padeiro também garantiu uma segurança financeira, que proporcionava certo conforto a Joughin. Ele era casado há seis anos e residia com a esposa em Liverpool, onde, em 1907 e 1909, tiveram dois filhos, sustentados pelo salário mensal de 12 libras — cerca de 1.047 libras nos dias de hoje, com o ajuste da inflação — como padeiro-chefe em expedições.
No Titanic não foi diferente; liderava uma equipe com treze padeiros para servir 324 pessoas na primeira classe e 284 na classe secundária. No momento da colisão, entretanto, Charles estava de folga, repousando em seu beliche, cujo quarto ficava perto da carcaça onde o motor estava instalado. Com o choque começou a apressar-se para ajudar o máximo de pessoas possível.
Por volta da 00h15, reuniu os treze funcionários e começou a preparar pães para fornecer aos botes salva-vidas, além de organizar uma operação para levar os pães e bolos que já estavam prontos para o convés, entregando os mesmos nos barcos. Com um fluxo insano, temperaturas altas e o estresse, Joughin abriu o espaço durante uma pausa para se embebedar um pouco.
Essa decisão ajudou a tornar o padeiro em um cara ainda mais corajoso e heroico, que decidiu acompanhar os padeiros que subiam ao convés para ajudar na situação mais perigosa da operação; a transição de pessoas para os botes, ajudando algumas mulheres e crianças a subirem nos barcos de emergência.
Com a situação agravando, algumas mulheres recusaram sair do Titanic, afirmando não acreditar na gravidade do naufrágio e estarem mais seguras no navio. Joughin, já “alegre” pela bebida, não quis saber de indecisão e puxou as moças para fora do navio à força, as empurrando para os botes salva-vidas.
Ao ver a situação caótica, Joughin voltou a sua cabine e bebeu o máximo de uísque que conseguiu, preparando-se para estar calmo e anestesiado, porém, a embriaguez liberou o seu lado criativo e mirabolante, que ajudou ainda mais tripulantes. Ao descer para o deck de passeio marítimo, teve outra ideia.
Havia 50 cadeiras de praia para repouso, onde o padeiro teve a ideia de atirá-las em direção as pessoas que caíram na água sem amparo dos botes, para usarem as mesmas como boias de flutuação na água gelada. Porém, com seus nervos sensoriais piorando devido a bebedeira, alguns sortudos conseguiram pegar as cadeiras, mas outros apenas receberam uma cadeirada na cabeça.
De acordo com os relatos dos últimos barcos que partiram, Joughin foi o último homem a ser visto no Titanic, na ponta superior do navio, que nessa altura já estava quase inclinado de maneira horizontal. Quando não pôde se estabilizar, desceu como se o convés fosse um escorregador e pulou na água por conta própria.
Até ser descoberto, passou três horas no Oceano Atlântico, com a temperatura da água a -2°C. A temperatura e o tempo planando seria suficiente para levar alguém a óbito, porém, seu corpo tinha tanto álcool etílico circulando em seu organismo que, ao causar a perda de calor interno, pôde se manter estável com a sensação de aquecimento em sua superfície da pele, superior à temperatura ambiente.
Agarrado pelo cozinheiro Isaac Maynard, que o reconheceu, não conseguiu entrar no bote que foi avistado, pois estava lotado, mas o segundo oficial Charles Lightoller autorizou Joughin a se apoiar no barco para ser levado até que fosse visto outro barco que pudesse o abrigar. Pouco depois, foi resgatado pelo RMS Carpathia.
Pelo resto da vida, continuou trabalhando como padeiro e chegou a participar de outro naufrágio, em 1920, onde também saiu com vida do SS Oregon, no porto de Boston. Seu último trabalho como padeiro, foi alimentando tropas da Segunda Guerra Mundial, em 1944. Joughin morreu aos 78 anos, em 1956, em decorrência a um ataque de pneumonia.
Para saber mais historias curiosas sobre o Titanic, procure os livros:
Titanic: Minuto a Minuto, de Jonathan Mayo (2017).
Titanic – A história completa, de Philippe Masson (2011).
Imagem: Charles John Joughin (à esq.) junto ao barco RMS Titanic no dia de sua partida (à dir.) –

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Philipe Kling David
Philipe Kling Davidhttps://www.philipekling.com
Artista, escritor, formado em Psicologia e interessado em assuntos estranhos e curiosos.

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Comentários

  1. O titanic teve dois irmãos gêmeos: olympic e britannic. Teve dois caras trabalharam nos 3 e sobreviveram: Violet Jessop e John Arthur Priest. O britannic afundou com uma mina alemã e o olympic sofreu vários acidentes graves mas nunca chegou a afundar (foi aposentado em 1935).

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