Horror em Londres: A bizarra história do “Jack dos saltos de molas”

O terror de Londres

O lendário Jack dos saltos de molas era um nobre irlandês conhecido como o “Marquês Maluco”?

No final de 1837, uma onda de pânico começou a se espalhar por Clapham, no sul de Londres. Algo terrível estava saindo da névoa e atacando os residentes locais.

Uma senhora idosa visitando o cemitério de Clapham foi uma das primeiras a ver a figura arrepiante. Vestida com uma capa escura, com um chapéu puxado sobre o rosto, ela o viu dar um pulo espetacular por cima de uma cerca alta e desaparecer na escuridão.

Mais ou menos na mesma época, uma jovem chamada Mary Stevens relatou um encontro com o mesmo personagem estranho.

Dando um salto gigante para fora de um beco escuro, ele lançou um ataque terrível contra a garota, rasgando suas roupas com suas garras frias e pegajosas. A menina gritou por socorro e a criatura fugiu.

Na noite seguinte, uma figura semelhante saltou em um ônibus causando sua queda. Várias testemunhas viram a figura escapar da cena saltando sobre um muro de 9 pés de altura, sua risada aguda desaparecendo na distância.

A criatura era mais parecida com uma fera nos relatos anteriores

Em breve, a notícia dos ataques chegaria às autoridades. Sir John Cowan, o Lorde Major, recebeu uma carta anônima alertando-o sobre a onda de ataques. Cowan inicialmente considerou a carta um absurdo, algum tipo de pegadinha debilóide.

No entanto, em poucas semanas, ele foi inundado com relatos semelhantes de ataques por toda a Londres e foi forçado a convocar uma reunião pública para discutir a misteriosa onda de crimes.

As notícias também começaram a chegar à próspera imprensa tabloide. Embora os primeiros relatos variassem enormemente, foi aqui que a aparência e o modus operandi de Jack foram fixados, e seu nome famoso – ‘Spring Heeled Jack’ (tradução livre como Jack dos saltos de molas) nasceu pela primeira vez.

De acordo com os jornais, Jack tinha orelhas pontudas e nariz adunco, garras ferozes e olhos vermelhos brilhantes. Por baixo de uma capa escura, ele usava uma roupa impermeável apertada. Sempre presente estava sua capacidade milagrosa de pular grandes alturas.

Na década de 1830, os impostos sobre o papel e a impressão foram bastante reduzidos, levando a um boom de mídia impressa popular e barata, jornais e uma espécie de história em quadrinhos chamada penny dreadful.

Essas publicações estavam famintas por contos sinistros de crime e terror, e as histórias de Spring Heeled Jack imediatamente cativaram sua imaginação.

Foi nesse tipo de literatura que Jack se tornou uma espécie de supervilão vitoriano, suas habilidades e aparência extremamente exageradas. Agora seus saltos eram sobre prédios inteiros; às vezes ele podia até voar. Seus olhos brilhavam vermelhos e ele podia cuspir um tenebroso fogo azul de sua boca.

A imprensa exagerou maciçamente os ataques

Enquanto isso, o verdadeiro Spring Heeled Jack estava prestes a fazer seu ataque mais famoso e bem documentado.

Em uma casa na extremidade leste de Londres em fevereiro de 1838, a adolescente Jane Alsop atendeu a porta e foi saudada por uma figura sombria.

“Eu sou um policial. Pelo amor de Deus, traga-me uma luz, pois pegamos Spring Heeled Jack aqui na rua! “

Buscando uma vela para o homem, Jane se assustou com sua aparência estranha. De repente, ele tirou a capa e começou a atacar a garota. Seus olhos brilharam vermelhos e ele cuspiu chamas azuis enquanto arranhava as roupas da garota com suas garras de metal.

Com a ajuda de sua irmã, a garota finalmente conseguiu se livrar das garras de Jack e se retirou para a segurança da casa.

O fato de Jane ter exagerado os aspectos estranhos da aparência de Jack, talvez influenciada por relatos da imprensa, é um fato perdido na história. Mas a polícia e o magistrado trataram seu relatório como um ataque real.

De fato, apesar das qualidades aparentemente sobrenaturais que Jack possuía, John Cowan, o Lorde Prefeito e a polícia estavam certos de que os ataques foram cometidos por um homem de carne e osso e não um ser sobrenatural.

Houve avistamentos semelhantes nas semanas anteriores ao caso  e vários culpados foram sugeridos – suspeitou-se de um pedreiro chamado Payne, junto com um carpinteiro chamado Millbank. No entanto, nenhuma identificação positiva foi feita.

Foi o Marquês de Waterford o famigerado Spring Heeled Jack?

Uma teoria que circulava era que os ataques foram cometidos por um bando de aristocratas decadentes em troca de uma aposta. A ideia de que a jovem aristocracia debochada poderia ser uma ameaça à sociedade era popular na época, especialmente na imprensa popular da classe trabalhadora.

O indivíduo mais mencionado na imprensa, especialmente no final do século 19, era o 3º Marquês de Waterford, Henry de La Poer Beresford.

Beresford era popularmente conhecido como o ‘Marquês Louco’ por suas travessuras e situações bêbadas ultrajantes. Ele também estava em Londres na época dos primeiros assaltos.

Ele poderia estar por trás dos ataques misteriosos de Spring Heeled Jack?

Em busca de provas

Os aristocratas foram apontados como culpados pela primeira vez em uma carta anônima ao Lord Major em 1838. Logo depois, o nome do Marquês de Waterford foi associado ao caso pela primeira vez.

Não é difícil ver por que ele se tornou um suspeito. Ele era famoso no final da década de 1830 por vandalismo, libertinagem, bebedeiras, confusões, pegadinhas e comportamento considerado “ultrajante”… Praticamente um Youtuber.

Muitas de suas travessuras infernais foram amplamente divulgadas na imprensa, especialmente o notório incidente em Melton Mowbray que deu origem à frase “pintar a cidade de vermelho”.

Depois de um dia nas corridas, Waterford e seus amigos caçadores de raposas vandalizaram o centro da cidade com tinta vermelha durante uma confusão de bêbados.

O Marquês, um ex-boxeador, era jovem e atlético na época dos avistamentos e poderia ter igualado as façanhas físicas menos estranhas de Jack. Ele também tinha uma tendência particularmente cruel.

Não parecia muito exagero sugerir que ele também poderia estar por trás dos ataques Spring Heeled Jack, talvez como uma aposta entre membros de seu grupo de amigos com mais dinheiro que modos.

O vandalismo e as pegadinhas de bêbado de Waterford eram notórios

Em 1880, E. Cobham Brewer, autor do Dicionário de frases e fábulas de Brewer, chamou Waterford de Jack, embora não esteja claro em que baseou isso.

Brewer escreveu que o Marquês – “… costumava divertir-se saltando sobre os viajantes desprevenidos, para os assustar, e de vez em quando outros seguiram o seu exemplo tolo”.

O autor Peter Haining escreveu o relato moderno mais influente do fenômeno Spring Heeled Jack em 1977.

Seu livro ‘The Legend and Bizarre Crimes of Spring Heeled Jack’, também apontou o Marquês de Waterford como o ofensor. No entanto, a confiabilidade das evidências de Haining foi questionada por alguns historiadores.

Haining teorizou que o marquês se sentiu humilhado pelas experiências ruins que teve com mulheres e a polícia. Junto com seus companheiros ricos, ele sonhou com a ideia de Spring Heeled Jack para se vingar.

Com a ajuda de amigos com experiência em mecânica, Waterford foi capaz de construir botas especiais de salto com mola para alcançar a incrível habilidade de salto de Jack.

De acordo com Haining, para aperfeiçoar a experiência do susto, o Marquês até aprendeu a cuspir fogo!

Uma questão de tempo

Uma das razões pelas quais o nome de Waterford apareceu como suspeito foi o fato de sua presença em Londres coincidir com os primeiros ataques de Spring Heeled Jack.

O Marquês de Waterford viveu na área dos primeiros ataques em 1837 e 1838, e após sua partida de Londres em 1842, os relatos de avistamentos de Jack desapareceram.

Um ataque típico de Spring Heeled Jack, conforme descrito nos livros de terror

Waterford voltou para a Irlanda com sua nova esposa e, segundo consta, deu as costas a piadas cruéis para levar uma vida respeitável, até sua morte em 1859.

Relatórios intermitentes de outros avistamentos de Spring Heeled Jack continuaram depois disso. Se Waterford foi o responsável pelos primeiros ataques, então, como sugeriu Brewer, esses casos posteriores foram copiadores.

Outra evidência para sugerir que o Marquês de Waterford pode ter sido o original Spring Heeled Jack foi a semelhança relatada entre uma crista manchada no peito de Jack com o brasão de Waterford.

Uma das vítimas de Jack, um jovem criado em uma casa no sul de Londres, escapou de um encontro com o monstro com apenas um susto.

Ele, no entanto, supostamente observou um elaborado brasão bordado na fantasia do agressor, encimado por uma letra “W”.

O W poderia representar Waterford? Talvez o marquês tivesse se apropriado de um velho traje de família, completo com brasão, para completar seu traje?

Contraditório

Fato e ficção

O principal problema com a identificação do Marquês de Waterford como Spring Heeled Jack é a falta de evidências históricas verificáveis ​​para apoiá-lo.

Como grande parte da história, fato e ficção se fundiram ao longo de incontáveis ​​releituras. No final do século 19, ficções definitivas sobre Jack eram regularmente relatadas como fatos históricos.

Os terríveis jornalecos de um Penny, em particular, exagerariam alegremente os ataques reais e até inventariam outros inteiramente novos, de maneira muito parecida com o que o jornal “Notícias Populares” fazia no Brasil nos anos 80, como contei aqui no post do bebê diabo.

Muitos dos supostos atributos sobrenaturais de Jack também se originaram com essas publicações.

A imprensa teve um forte papel na estrutura mítica sobre Jack dos saltos de molas

De acordo com alguns historiadores, muitos dos fatos que ligam Waterford a Spring Heeled Jack quase certamente foram baseados em adornos ficcionais posteriores.

A história do menino criado observando a letra W na fantasia de Jack não está presente em nenhuma reportagem de jornal. Provavelmente se originou em uma das incontáveis ​​versões posteriores que procuraram vincular os crimes a Waterford.

Outro encontro frequentemente citado com Spring Heeled Jack também parece ser inteiramente mítico. Uma jovem chamada Polly Adams lembrou-se de um ‘nobre como o diabo’ com olhos esbugalhados a agredindo na Feira de Blackheath.

Novamente, nenhum registro deste ataque aparece em qualquer fonte contemporânea. O propósito desta história claramente ficcional torna-se claro quando a aparência física do Marquês de Waterford é levada em consideração.

O aristocrata irlandês teria olhos excepcionalmente salientes, indicando que o ataque apócrifo de Polly Adams foi outra tentativa grosseira de vincular os crimes a Waterford.

O caso de Jack dos saltos de mola é interessante do ponto de vista da construção de uma mítica social e como ela se desenvolve com o passar do tempo, estabelecendo raízes, produzindo testemunhas “oculares” da criatura. De uma certa maneira, Jack dos saltos de molas pode colocar em perspectiva diferentes mitos modernos, entre eles o Pé grande, e diversos casos envolvendo seres extraterrestres.

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Philipe Kling David
Philipe Kling Davidhttps://www.philipekling.com
Artista, escritor, formado em Psicologia e interessado em assuntos estranhos e curiosos.

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Comentários

  1. Interessante esse caso. Me lebrou de um episódio do senho animado ” As Aventuras de Jackie Chan”, em que ele é um arqueólogo, em que encontra um duende que saltava com molas nas botas do século 19 e que gostava de causar a maior confusão. Só que ele saía das ruína subterrâneas de São Francisco dos EUA do grande terremoto do seculo 19.
    Não sei porque me parecia ser alguma referência de alguma lenda do século XIX na e´poca que assiti. Agora vejo aqui que é mesmo.
    É interessante lembrar também sobre o mito ter crescido, que no século XIX havia muito o interesse pelo sobrenatural e o estranho e mórbido, o que está nas raízes da literatura romântica da época, que como aprendemos em literatura, tinha muito no romantismo o sobrenatural e o mórbido. Muito interessante essa história.

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