Existem mais estrelas no espaço do que grãos de areia na Terra

Outro dia eu estava vagando a esmo pelo facebook e encontrei um texto que achei muito legal. Mas para meu azar acabei perdendo aquele texto de vista, e fiquei com isso na cabeça durante um bom tempo. Com mais de mil pessoas na minha lista de amigos, localizar um texto publicado por um deles tornou-se como achar uma agulha num palheiro. Ontem, eu finalmente consegui achar o maldito texto e é com base nele que construo este post.

O que eu achei interessante no texto era que falava sobre algo que muitas vezes eu me perguntei. Quando eu tinha uns 16 anos, meus pais tinham uma casa de praia em Cabo Frio e lá eu passava muitas noites olhando o céu magnificamente estrelado acima da minha cabeça. Enquanto olhava aquele mundaréu de estrelas, deitado no capô do Del Rey do meu pai, eu me perguntava quantas delas existiam. A resposta mais fácil é também imprecisa: Infinitas.

É fácil olharmos para aquela mutueira de pontos brilhantes no espaço e pensarmos que aquilo não tem fim. Mas tem. E a lógica disso é simples, se teve um início, conforme as teorias do Big Bang apontam (desculpa o mau jeito aí, pessoal que acha que Deus mandou criar a Luz) o universo se formou de uma unica e violentíssima explosão, de magnitude incompreensível para nossa mente limitada. Por ter seu início num ponto definido, sabemos que o volume de matéria do universo tem fim. Ninguém sabe ainda onde é este fim, nem como ele é ou o que há depois dele. Mas sabemos que há estrelas nascendo, estrelas morrendo, estrelas explodindo, e até mesmo estrelas cadentes (não os meteoritos, mas estrelas MESMO que estão vagando em altíssima velocidade, viajando sem rumo pelo espaço, após serem lançadas para as profundezas por explosões insólitas ou efeitos catapulta dos buracos negros). Contar as estrelas é uma tarefa difícil, até porque, como as distâncias do cosmo são cavalares, muitas estrelas que podemos ver hoje já nem existem mais. É como se olhando para cima víssemos uma reprise de um filme mudo dos anos 20… Todo mundo ali já morreu, mas parece que não.

Com tamanha dificuldade em determinar o número exato de estrelas no universo, como que Ben Burress, o autor do tal texto, conseguiu concluir que o velho ditado está certo ou não?

Ele estava sentado na praia de Limantour em Point Reyes, observando as ondas deslizarem para dentro e para fora, ouvindo as gaivotas e se sentindo preguiçoso. Ben olhou para aquela areia toda da praia e começou a se perguntar como o tal dito popular poderia ser verdade. Ele estendeu a mão e pegou um punhado de grãos. Após deixar algumas centenas de milhares de pequenos grãos caírem ele percebeu que aquela noção parecia ainda mais absurda.

Mas Ben não estava disposto a sacrificar seus neurônios em vão. Ele começou a sentir um ímpeto de fazer algumas contas para ver se realmente aquilo poderia fazer sentido. Num pedaço de jornal, começou a rabiscar números freneticamete. Aqui está o que ele descobriu:

As estrelas – Ben sabia que os astrônomos estimam que existam cerca de 200 bilhões de estrelas, somente aqui na Via Láctea. De fato nossa Via Láctea não é uma galáxia que se diga, “puxa, que galáxia enorme, meu Deus, é incrivelmente grande”… (Perdão. Ando vendo muito Chaves)

A verdade é que o cosmos está cheio de galáxias de vários tamanhos, muitas muito maiores e outras consideravelmente menores do que a nossa Via Láctea. Dá uma olhada aí na imagem abaixo e sinta-se perplexo na razão inversa do que você se sentirá insignificante:

O “Subaru Deep Field” é uma fotografia criada usando o telescópio “Subaru”, durante 30 noites em um período de 2 anos. Ela nos mostra a época em que o Universo era muito jovem.
Nela há mais de 200.000 galáxias! Clique na imagem para ver no tamanho original.

Como Ben Burress não sabia dizer ao certo o número médio de estrelas em cada galáxia, resolveu escolher um número conservador: 10 bilhões de estrelas por galáxia.

[box type=”note” color=”#fff” bg=”#ffbb00″ font=”arial” fontsize=”16″ radius=”10″ border=”#000″]De fato, ele foi conservador! Usando  versão de Newton para a Terceira Lei de Kepler, chegamos a um valor aproximado de 200 bilhões de estrelas só na Via Láctea, que como dito, não é das maiores! [/box]

Ele também sabia que os astrônomos estimam que existam entre 50 bilhões e 100 bilhões de galáxias no Universo, com base em observações feitas pelo Telescópio Espacial Hubble. Novamente sendo conservador, escolheu o número mais baixo, de 50 bilhões. Assim, com esses números, ele esperava poder calcular um número de estrelas no Universo em 10 bilhões vezes 50 bilhões, ou 500 bilhões de bilhões – que em notação exponencial é 5 x 10 ^ 20.

Esta imagem em cores composta do Hubble Ultra Deep Field foi criado pelo Telescópio Espacial Hubble e mostra galáxias em círculos verdes, alguns dos quais podem ser a partir de quando o Universo tinha entre 650-480000000 anos. Cerca de 20-30 por cento desses candidatos estão muito perto de galáxias em primeiro plano, o que pode afetar a sua aparência através do efeito de lente gravitacional. Crédito: NASA, ESA, Z. Levay e A. Feild (STScI) Crédito: NASA, ESA, S. Wyithe, R. Windhorst, e S. Mao. Agradecimentos: G. Illingworth e R. Bouwens e da Equipe HUDF09.

É um volume bem grande de estrelas… Mas como o número de grãos de areia nas praias do mundo inteiro se sai?

Para chegar a esse número, era em alguns aspectos uma coisa mais complexa. Era necessário, óbvio, fazer estimativas, já que contar estava fora de cogitação. Ben atribuiu arbitrariamente um valor, onde uma média de areia de praia equivale a 30 metros de largura e 10 metros de profundidade. Algumas praias são mais largas, algumas muito menores. Há também praias rochosas onde nem há areia. Ben imaginou que a areia de uma praia média é tão profunda quanto 10 metros, porque abaixo disso a areia compactada começaria a gerar um tipo de arenito, que está mais para uma rocha mole do que para areia mesmo… Mas temos que admitir que é somente um chute, já que isso pode variar absurdamente.

Em seguida, Ben determinou o tamanho do “grão de areia médio”. Ele chegou a um tamanho de 1 milímetro, dando-lhe um volume de cerca de um milímetro cúbico. Com esse número, Ben sabia que a densidade do grão de areia seria 1000 ^ 3, ou 1 bilhão de grãos de areia por metro cúbico de praia.

A parte final da equação, depois da densidade, largura e profundidade é o comprimento: o comprimento total da linha costeira das praia do mundo inteiro. Nesta parte Ben Burress precisou fazer novas suposições. Ele começou com o comprimento total de linhas costeiras de todos os continentes e ilhas do mundo, chegando a 356.000 km, um dado que obteve do CIA World Factbook. Isso dá 356 milhões de metros.

Sendo bastante conservador, Ben presumiu que todos os 356 milhões de metros de costa do mundo consistia de praias de areia, o que não é necessariamente verdade, é claro. Há uma abundância de costas que são rochosas, cascalhos, mangues, cobertas de gelo ou penhascos, tudo sem muita ou nenhuma areia.

Fazendo as contas, 1 bilhão de grãos por metro cúbico vezes uma praia média de 30 metros de largura vezes 10 metros de profundidade vezes 356 milhões de metros de comprimento e assumindo que 100% dos litorais consistiam de sua praia média hipotética, ele chegou a:

10 bilhões x 30 x 10 x 356 milhões x 100% = 1,068 x 10 ^ 20 grãos de areia.

Assim, ao fazer sua comparação com o resultado da estimativa de estrelas no Universo, o cara se surpreendeu com a percepção de que pelos números de seu cálculo, havia cerca de cinco vezes mais estrelas do que grãos de areia em todas as praias do mundo! Após seus momentos iniciais de descrédito, ele começou a pensar que talvez o dito popular seja muito modesto.

Talbez as próprias contas de Ben sejam mais modestas do que ele imaginava. Em um estudo divulgado pela BBC, parece que há mais estrelas no Universo do que grãos de areia em todas as praias, mas não só isso, como os desertos também!

Os dados são da Escola de Astronomia e Astrofísica da Austrália.

De acordo com Simon Driver, pesquisador da Escola, existem pelo menos 70 septiliões (70.000.000.000.000.000.000.000.000) de estrelas no Universo. Este numero seria algo como dez vezes maior que a quantidade estimada de grãos de areia na Terra. Entretanto, o astrônomo ressalta que a quantidade de estrelas deve ser maior ainda, já que os cálculos só incluem as estrelas ao alcance dos nossos equipamentos de medição atuais, e por mais potentes que sejam os telescóspios utilizados, sempre tem coisa que eles não conseguem “ver”.

OMFG! É muita estrela então, mané!

O cálculo foi baseado na luminosidade de cada galáxia. De acordo com a BBC, a pesquisa faz parte de um amplo estudo sobre galáxias, com objetivo de medir as distâncias somente entre as 250 mil galáxias mais próximas da Terra.

Curiosamente, segundo Ben Burress:

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É tudo uma questão de escala. Eu também calculei que existem cerca de 3000 vezes mais moléculas de água em um simples copo d’água do que estrelas no Universo…

fonte

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Philipe Kling David
Philipe Kling Davidhttps://www.philipekling.com
Artista, escritor, formado em Psicologia e interessado em assuntos estranhos e curiosos.

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Comentários

  1. Philipe… embora eu entenda todo o conceito filosófico de provar que a comparação está certa, ou talvez até errada pela modéstia dos cálculos e tenho que dizer que… ESSE CARA TEM TEMPO LIVRE HEIN ?

  2. Só não concordei em uma coisa: o volume médio de um grão de areia ser 1mm³. Creio que boa parte dos grãos de areia das praias da terra seja bem menor que isso. O que, obviamente, não diminui o fascínio diante do tamanho assustador do universo.

  3. gostei da metodologia dele… “vou pegar o número mais baixo daqui, o mais alto daqui, etc…”
    ele nunca ouviu falar de margem de erro?

  4. O que ninguem se deu conta, que depois de tudo isso, um copo dágua vence em termos de quantidade. A simplicidade sempre vem melhor. hahaha

  5. Post que da muito o que pensar. Lembrei de uma entrevista do Claude Lévy-Strauss:

    “Se oconhecimento científico abre-nos para o imensamente grande e o imensamente pequeno de perspectivas bem mais vertiginosas do que Pascal imaginava, ele nos demonstra nossa insignificância. Quer desapareça a humanidade, quer desapareça a Terra, nada mudará na marcha do cosmos. Donde um último paradoxo: não temos a mínima certeza de que esse conhecimento que nos revela nossa insignificância tenha alguma validade. Sabemos que não somos nada ou que não somos grande coisa e, sabendo-o, nem sequer sabemos se este saber é um saber. Pensar o universo como imensurável pelo pensamento, obriga-nos a pôr em dúvida o próprio pensamento. Não saímos disso.”

    De perto e de longe – Didier Eribon

  6. Em 100 mL de água (copo pequeno) há 5,6×10^23 moléculas de água. A área da superfície terrestre é 5,1*10^14 metros quadrados. Supondo que 1 grão de areia ocupa um volume de 1 mm cúbico, então se toda a superfície da Terra (oceanos incluídos!) tivesse 1 m de altura de areia (hipótese claramente excessiva)uniformemente distribuida, haveria 5,1×10^23 grãos de areia! Menos grãos de areia que moléculas no copo de água.
    O número de Avogrado é disparatadamente grande.
    Já fui.

  7. Multiplique vezes 10 e terá p numero de planetas. Ou vezes 50, o numero de luas. Uma caixa de 9x9x9 metros, cheia de areia, contem quantidade de grãos de areia equivalente ao número de estrelas de nossa galaxia.

  8. Não é só uma questão de escala. A quantidade de moléculas (que são minúsculas) ser maior que a de estrelas (que são gigantescas), é algo natural. Agora, a quantidade de grãos de areia (que são pequenos) ser MENOR do que a quantidade de estrelas… não é algo tão óbvio.
    Nunca vi um deserto pessoalmente (só fotos, filmes), mas ver aquela infinidade de grãos, sabendo que há mais estrelas no universo, que são GIGANTESCAS… dá uma ideia de como somos pequenos.

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