Eu queria…

Eu queria…

Ter o Naipe do Alain Delon

e o dinheiro do Eike

Aparecer na capa da revista

Ter pisado na Lua

Em nome da humanidade

Ter peito de dizer a verdade

E ganhado na fórmula um

Tocado pagode com o Mussum

Eu queria ter feito o gol da virada, na copa, de placa, nos quarenta e cinco e de  bicicleta

A cesta de três pontos do campeonato

E ter toda consagração

Eu queria ter acordado num chalé da Baviera, ou numa cabana polinésia

ou num chateau francês

Eu queria achar o bilhete premiado

Eu queria ter salvado uma vida, com doação ou ressuscitação, e abraçar a vítima num choro de gratidão

Eu queria ter chegado mais fundo, ido mais longe, chegado mais perto, voado mais alto

Eu queria ter corrido duna abaixo

Escalado montanha acima

E ficado sem ar de emoção

Saltado do trampolim na piscina

Eu queria ter descoberto a mina, encontrado o filão

Eu queria ter me esgueirado na passagem secreta

Para fazer aquela descoberta…Sem medo de assombração, nem maldição

Eu queria ter descoberto a cura, ter achado a chave, ter encontrado a palavra perdida, covardemente trancada na gaveta do esquecimento

Eu queria ter feito a musica, e planejado a canção

Eu queria ter rido mais e abraçado mais, delirado mais, de supetão

Eu queria ver as cores que nunca verei como vê um camarão

Eu queria ter pintado a tela, ter esculpido a peça, ter desenhado o projeto, ter tirado a foto, acendido o rojão

Eu queria ter gritado debaixo d´água, ter saltado a fogueira, engolido o vento, para voltar na contra-mão

Eu queria ter tido a coragem…

Esvaziar o garrafão

Ter respondido na lata, dado aquela bicuda no saco, dedo na cara e aplicar o mata-leão

Eu queria ter sacado a grana, pegado a arma, puxado o gatilho, chutado o balde, sujado a mão

Eu queria tomar de volta o que me foi tirado, mas com juros e correção,

Eu queria ser aplaudido em cena aberta, encontrar a palavra certa,

posicionar

A pedra angular

Da construção

Eu queria saber encontrar o caminho, para perder-me com exatidão.