quarta-feira, dezembro 11, 2024

Eu não pego avião

Eu não pego avião
è o avião que me pega
Me leva, me solta
Me carrega nas asas
Nas turbinas na ida,
Quem sabe na volta
Decola em subida
Grandes casas, agora casinhas
Ficando pequeninas
Meu coração palpita
Só de imaginar
As rodas girando no ar
E as turbinas
Em potente roncar
Não podem falhar
Queimam como brasa
Cortam a imensidão
Vem um medo a me atraiçoar
Vou me distraindo como posso
O medo de ter um troço
Lembro o show da tripulação
Que assisti atento
E sei que meu assento
Flutua no mar
Onde vive o tubarão
Onde são as saídas e as máscaras, que por ventura, cairão
Nessa aventura, tão acima do chão…
Espero sinceramente que não,
mas quem sabe sim?
Suco ou refrigerante, perguntaram pra mim
Tomaria se pudesse é um porre de gin
O cinto afivelado, vai tão apertado
Que quase me corta em dois
Do início ao fim
Segura meu corpo na imensidão
Parece que se soltar eu caio do avião
Me aperta com tremenda violência
Me deixa com forma de violão
De medo de turbulência
Esfrego meus pés no chão
Sob a poltrona apertada, onde mal me encaixo
Fico pensando no vazio lá em baixo
Olho pela janelinha e contemplo o espaço
Lá fora tanto frio
Já nem sei se o arrepio
Vem de cada pensamento sombrio
Que vilipendia a inteligência
Temo que o piloto declare emergência
E que essa desgraça se acabe em gritos
Ou num silêncio a lamentar
Temo ver a comissária chorar
e fazer escala em Nosso Lar
Num giro esquisito
E num mergulho trágico
Eu engulo o medo, sufoco o grito
Num esforço afágico
Mas que tanta besteira me inebria aqui em cima?
A comissária, tão bonita já se aproxima
E me pergunta de supetão, se massa ou carne
Aceito o que vier,
temendo ser a última refeição
como carne de colher
E bebo o suco com sofreguidão
Quero logo dormir
Me entregar aos braços de Morfeu
Acordo em jubileu
Quando me dou conta que já vamos pousar
Vem novo medo a abalar
Meu tormento aqui em cima
Aperta meu coração
Estoura de novo a adrenalina
Desce o pássaro, mais pesado que o ar
E movido a explosão
E me lembro de lembrar
De rezar em oração
Deus me guarde na ida e me proteja na volta
Que eu não pego avião
è o avião que me pega
Me leva, me solta
Quando as rodas tocam chão
Aplaudo com satisfação
E procedo valente, o desembarque
encaixo o medo no canto mais fundo do coração
Depositado em caução
Até o próximo embarque
O medo que agora a gente renega.
E mentalizo a regra
Eu não pego avião
è o avião que me pega.

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Philipe Kling David
Philipe Kling Davidhttps://www.philipekling.com
Artista, escritor, formado em Psicologia e interessado em assuntos estranhos e curiosos.

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