Evliya Celebi, o viajante árabe

Aqui esta um interessante personagem. Nascido em 1611, o Filho do principal joalheiro da corte do império Ottomano, Derviş Mehmed Zillî, conhecido como Evliya  Celebi tinha inteligência, sagacidade, amplo conhecimento do Alcorão. Seus dons musicais e linguísticos chamaram grande atenção – ele falava árabe, persa, grego e latim, o que atraiu a atenção do Imam Sultan Murad IV e no quando tinha apenas 12 anos, ele se tornou o leitor do Alcorão da corte, recitando às vezes passagens muito longas de cor.

Embora tenha nascido em Istambul, então capital do Império Otomano, a família de Evliya Çelebi era de Kütahya. Seu pai era joalheiro e sua mãe sua mãe era uma ex-escrava abecásia.

Mas não foram seus dotes intelectuais acima da média que deixaram Evliya Celebi marcado na História, se sim sua grande coragem. Celebi é descrito como um viajante contumaz, destemido e curioso. Uma noite, ele teve uma epifania que mudaria sua vida para sempre. Ele havia acabado de completar os 20 anos e naquela noite teve um sonho em que ninguém menos que o profeta Maomé em pessoa apareceu pra ele, assim como seus companheiros e os quatro primeiros califas do Islã.

Nesse sonho, ele foi instruído a abandonar seus planos de serviço no tribunal e, em vez disso, dedicar sua vida a viajar pelo mundo para que pudesse “compor uma obra maravilhosa” com base nela.

Ok, parece uma boa desculpa para largar tudo e sair andando por aí, mas temos que lembrar que nos tempos de Celebi, isso poderia soar como suicídio, a depender da direção para onde ele seguiria.  Mas a visual era poderosa e ela o alertou de um futuro glorioso:

“Você viajará por todo o mundo e se tornará um milagre entre as pessoas. Sobre os países pelos quais você passa, sobre seus castelos, fortalezas, antiguidades maravilhosas, comida e bebida … o tamanho de suas províncias e a duração dos dias lá, você fará uma descrição que será um monumento digno de você!”

Celebi acordou e tomou aquilo como um aviso real, uma verdadeira ordem de Maomé. Assim, ele assumiu as rédeas de sua própria vida, e nas três décadas seguintes viajou pelo mundo, partindo  com um grupo de mulas carregadas, camelos, companheiros de viagem e uma dúzia de escravos.

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Durante esse tempo, ele escreveu uma obra de 10 volumes chamada “Seyahatname” ou “Livro das Viagens”, obra conhecida também por Tarihi seyya (“Crônica do Viajante”). Esses livros que mais tarde foram chamados de “o relato de viagem mais longo e completo” da Literatura islâmica e, talvez, da literatura mundial.

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Em muitas centenas de páginas, esta obra-prima fala sobre os costumes de várias terras, comidas exóticas, animais, batalhas sangrentas, bem como sobre as paisagens, a etnografia, história e também da geografia dos países que visitou na Europa, Ásia e África.

Celebi também deixou muitas notas sobre criaturas muito estranhas com o qual se deparou. Bruxas, vampiros e até mortos-vivos! São os fenômenos sobrenaturais que ele testemunhou pessoalmente que atraem grande atenção das pessoas lelés da cuca curiosas como eu.

 

A guerra das bruxas

A história lembra até uma aventura de Conan, o Bárbaro. Esse incidente aconteceu com ele na noite de 26 de abril de 1666, na pequena aldeia caucasiana de Pedsi. Celebi afirmou que naquela noite escura e sem lua, um raio muito forte brilhou repentinamente na estrada, o que o despertou do descanso no acampamento.

O clarão foi seguido por outro mais forte e em seguida mais outro, e quando Chelebi perguntou aos aldeões mais próximos o que estava acontecendo, eles lhe disseram que uma vez por ano havia uma noite durante a qual “bruxas circassianas e bruxas abkhazianas decolam para o céu e travam uma grande guerra.”

Impressionado com o que ouviu, Celebi saiu para a rua e, quando ergueu os olhos para o céu, viu ali:
“bruxas em grandes árvores, cubos, barcos, rodas de carroças e muitos outros objetos semelhantes, lutando com bruxas sentadas em cavalos, gado, animais mortos, inclusive em camelos mortos, com cobras, cavalo e cabeças de camelo em suas mãos.”

Tudo isso estava acontecendo contra o pano de fundo de contínuos flashes intermitentes e raios de luz, dos quais emanava de uma luz brilhante no céu. Só agora Celebi podia ver que não era de um raio, mas todos os clarões provinham do poder mágico de sua feitiçaria.

Em algum momento, houve uma explosão particularmente forte e ensurdecedora, após a qual

“feltro, postes, cubos, portas e rodas de carruagens, bem como partes de pessoas e animais como cavalos caíram do céu, após o que também sete bruxas abkhazias e sete bruxas circassianas caíram no chão, onde se levantaram e continuaram a lutar. 

Celebi observa especificamente que ele nunca teria acreditado que isso fosse possível se ele mesmo não tivesse visto tal pandemônio nos céus, e só podemos adivinhar o que aconteceu aqui.  Teria ele visto um fenômeno ufológico hostil e interpretado como uma guerra de bruxas?

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Outros encontros com bruxas

Evliya Celebi também escreveu sobre seus outros encontros com bruxas. Em uma ocasião, ele parou na aldeia búlgara de Chalykkavak quando se deparou com “uma velha infeliz com cabelos desgrenhados e rosto feio, que tinha sete filhos”.

Esta mulher e seus filhos entraram na casa não muçulmana onde ele estava hospedado e se reuniram em volta da lareira de forma acintosa e pouco cordial.

Obviamente que isso irritou as anfitriãs desta casa, que a essa altura, Celebi ainda não sabia, mas também eram bruxas. Elas coletaram algumas cinzas e lançaram algum tipo de feitiço secreto, após o qual a velha bruxa e as crianças se transformaram galinhas bem na frente de Celebi e outros membros de sua expedição, assustando-o profundamente. Mas o que ocorreria a seguir, ainda seria mais estranho:

“E aí o nosso anfitrião pagão urinou nas galinhas e nesse momento todas viraram gente de novo. Aí várias outras pessoas pegaram a mulher e seus filhos pelas mãos e deram uma surra  neles. Fomos e vimos que os clérigos estavam onde chegaram depois. As pessoas entregaram a mulher ao padre, e o padre imediatamente a excomungou da igreja. Meu pessoal jurou depois desse incidente que todos viram esse incidente e testemunharam como as galinhas se transformaram em pessoas. Naquela noite, meu sangramento nasal não parou, de tanto medo que senti. De manhã, felizmente meu sangramento parou.”

 

Existem outras histórias dele sobre bruxas, que são mais parecidas com ataques de vampiros. Celebi afirmou que toda a região do Cáucaso é especialmente repleta das tais criaturas. Ele escreveu sobre bruxas sugadoras de sangue vagando por aldeias remotas, atacando pessoas e bebendo seu sangue. Depois disso, a vítima do ataque adoecia, e morria. Alguns ressuscitavam dos mortos para se transformar em uma bruxa vampira e atacar pessoas vivas tempos depois.

As pessoas disseram a ele que essas criaturas terríveis dormem no chão durante o dia, ocultas em sepulturas, ruínas, tocas e cavernas,  e, se você as desenterrar durante o dia, poderá encontrar seus corpos com pele avermelhada e olhos vermelhos. Para matar tal “bruxa”, ela precisaria ser perfurada com uma longa estaca de um arbusto de amoreira no estômago, e então o corpo deveria ser queimado no fogo até que restassem apenas cinzas.

E, supostamente, se isso for feito, todos aqueles que esta “bruxa” conseguiu morder e “transformar” em “vampiros” voltarão a ser pessoas normais.

Em outros casos, uma bruxa bebedora de sangue foi capturada, acorrentada e forçada a confessar sua magia, após o que ela foi estacada e sacrificada, mas não antes que um pouco de seu sangue fosse levado para esfregar as vítimas afim de curá-las de doenças.

Se alguns dos detalhes aqui soam suspeitosamente familiares para você, é porque histórias como essas são consideradas algumas das primeiras histórias de vampiros, e acredita-se que tenham influenciado Bram Stoker em seu livro Drácula, que despertou a mania dos vampiros em todo o mundo. Os historiadores ainda não sabem como tratar tais páginas nos livros de Celebi. Ele é considerado um muçulmano muito devoto e, portanto, seria um pecado bastante grave para ele descrever algo falso. Ao mesmo tempo, em seus livros você pode encontrar tantas coisas estranhas que é simplesmente impossível acreditar em tudo.

 

Por exemplo, ele escreveu sobre o encontro com uma mulher do Mar Negro que deu à luz um elefante, sobre as tribos do Sudão montando rinocerontes ou sobre os budistas canibais de Kalmia. Sobre monstros gigantes parecidos com pássaros, pessoas com cabeças de animais, quimeras, bestas parecidas com dragões, plantas gigantes diferentes de tudo que se conhece, uma estranha árvore amarela cujas folhas curam milagrosamente a sífilis e muitas outras estranhas anomalias.

Os historiadores discutem se essas “histórias fabulosas” são simplesmente provocações satíricas contra os escritores de viagens que escreveram, por exemplo, sobre tribos de pessoas sem cabeça, ou uma homenagem aos contos das Mil e Uma Noites que provavelmente influenciaram Celebi na infância. Ainda hoje suas visões e narrativas seguem em debate.

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Philipe Kling David
Philipe Kling Davidhttps://www.philipekling.com
Artista, escritor, formado em Psicologia e interessado em assuntos estranhos e curiosos.

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