Viagens de fim de ano

Pouca gente deve ter percebido que o Mundo Gump está funcionando automaticamente desde antes do natal. Eu escrevi um montão de posts para cada um dos dias em que estarei viajando. Eventualmente, eu entro numa lan house para acompanhar os comentários.

Passei o natal com a primeira dama e amigos da família dela em uma zona rural de Friburgo. O pessoal de lá são pessoas sensacionais e ultra-simples. Eu admiro essas pessoas que dão um duro do caramba, contra todas as dificuldades da vida e ainda por cima estão sempre felizes. O pessoal de Campinas é assim. Embora só tenhamos dormido na casa deles uma única noite, estávamos na Luange, uma pousadinha muito legal a alguns quilômetros dali, íamos e voltávamos para a casa deles todos os dias. A pousada estava vazia e o dono, o “Seu Zezinho” ofereceu pra nós o melhor quarto disponível sem mudar o valor. Um dia tomando café da manhã, eu pude bater um papo longo e sem pressa com ele, que me contou toda sua vida.

Para minha surpresa, “Seu Zezinho”, um velhinho de mais de 80 anos, era lutador de Jiu Jitsu, que aprendeu (todos os empregados eram obrigados a aprender) com a família Gracie, onde foi mordomo na juventude. Ele me contou todas as reviravoltas que a vida ofereceu pra ele no longo e sofrido percurso que transformou um jovem copeiro de 15 anos de idade ao dono de vários hotéis e pousadas.

Ele também entrou na faculdade de administração junto com o filho, já depois dos 70. A história daquele senhor que eu descobri no meio de uma região linda e fria, dava um belo livro. Enquanto contava, aquele velho senhor ganhava uma estranha felicidade, e seus olhos brilhavam ao contar as aventuras. Mas quando sua vida começou a se aproximar dos dias atuais, ele começou a ficar mais triste. Lembrava da esposa, uma velhinha que estava lá na pousada. Ela havia sofrido um AVC e agora precisava dele para tudo. Desde botar calcinha a se alimentar. E Seu Zezinho cuidava com extremo cuidado da sua idosa companheira, e ao mesmo tempo administrava duas pousadas.

Quando saímos de Friburgo, voltamos para Niterói onde eu pude dar uma olhada no Mundo Gump e conferir alguns detalhes. No dia seguinte, saímos ligando para tudo que era pousada em Visconde de Mauá. Ligamos para incontáveis pousadas e estava praticamente tudo lotado, até que achamos uma. Naquele mesmo dia, minutos depois, estávamos no no carro, o GumpMóvel nos dirigindo para a serra que fica na divisa do Rio com Minas Gerais. Chegar lá foi super simples. Pegamos o contra-fluxo dos paulistas que vinham para o Rio passar o ano novo e a estrada estava vazia.

Quando começamos a subir a serra, a primeira surpresa: Acabou o asfalto.

Encaramos uma poeirenta e acidentada estrada de 20km serra-acima para chegar em Visconde de Mauá. A paisagem é desbundante. Uma vista sensacional, que vai se renovando a cada curva. A cada árvore.

Chegamos na pousada, descarregamos as muitas malas e fomos para as cachoeiras.
Nossa, que legal que é Mauá. Tem cachoeira que não acaba mais. Uma mais bonita (e difícil de chegar) que a outra. MAs vou dizer uma coisa. Não pode ter pena do carro. Quem tem pena de enfiar o carro em buraco e em trechos estreitos e perigosos, a beira de abismos, em estradas que parecem mais o Rally Paris-Dakar, é melhor ir só a Penedo, que é mais cosmopolita e asfaltada. Não tem o lance da aventura que Mauá e suas cachoeiras escondidas em florestas tem.
Não deu para ver todas, porque o tempo era curto e o nosso foco era apenas curtir e não catalogar as cachoeiras. A que eu mais gostei foi uma ultra-escondida, a mais distante que nós fomos, que é a Cachoeira da prata. Durante o percurso, eu me perguntei inúmeras vezes se não estava errado o caminho. Não havia nenhum carro. Éramos só eu e a primeira dama, seguindo um mapinha bem esquemático que não fazia jus ao torturante caminho real que levava a uma propriedade

particular. Lá conhecemos uma outra figura muito doida. Curiosamente também era “Seu zezinho”. Mas eu comecei a chamá-lo de “seu Zezão”. A entrada para a cachoeira do rio da prata era pela casa do coroa, que era engraçadão. Sabe aquele jeito engraçado e meio sacana do Tim Maia? Seu Zezão era assim. Ele quis porque quis que eu tomasse a fabulosa – e segundo ele – reconhecida internacionalmente, cachaça com mel. Mas eu não tomei, porque não tomo cachaça. Nunca tomei pinga na vida. Ele ficou meio chateado mas entendeu.

Descemos por um acesso que dava dos fundos da casa do cara (uma fazendinha com curral e o caramba) a uma incrível trilha na mata. A descida era altamente perigosa, com raízes funcionando como degraus. Depois de alguns minutos descendo de gatinho, apoiando com a bunda para não escorregar e segurando em raízes para não descer a pirambeira rolando, começamos a ouvir o barulho ensurdecedor de uma cachoeira. Demos de cara com um belo arranjo da natureza. Uma cachoeira enorme que escondia atrás de seu véu uma pequena gruta. A água era fria como o catiço.

 
 

Parecia água de degelo de geladeira. Mas mesmo assim, nós encaramos. Depois de nadarmos e nos esbaldarmos numa verdadeira surra de águas geladas, resolvemos descer ainda mais a trilha em busca de novas emoções.
E foi o que encontramos. Descendo pela trilha ainda pior (beeeem pior) que o ínício, eu me sentia o Indiana Jones em busca de algum templo oculto na floresta. Quando chegamos no fim da trilha, ali estava uma cachoeira monumental, com uma queda dágua irregular entrecortada por rochas de todos os tipos e até algumas árvores derrubadas. Um dos lugares mais bonitos que eu já fui na vida, onde pude contemplar a paz e o sossego. E ainda por cima ali a água estava mais quente. (obviamente que eu era que estava mais acostumado com a temperatura). Ficamos por ali mais alguns minutos até que eu fui explorar o lugar e descobri uma piscina natural de águas límpidas, que refletiam um verde da paisagem. O lago era alimentado por duas pequenas cascatas.
Foi ali que passamos a maior parte do tempo. Durante este período tivemos a companhia de um cão vira-lata misto de husky ciberiano de olhos absolutamente azuis e pêlo tigrado. O cão era super bonzinho e parecia ser adestrado. Ele me acompanhou em todas as trilhas, subindo e mostrando o caminho.
O cão, que se chamava “tigre” adorava colecionar pedras. E ficamos brincando e pegar pedras e dar para ele. Ele pegava a pedra copm extrema delicadeza da mão da gente e levava e fazia um montinho delas do lado das nossas tralhas. (toalha, canga, máquina fotográfica, bolsa térmica, etc)
Quando finalmente subimos de volta para a fazenda do seu Zezão, eu pensei que ia desmaiar. A subida era mil vezes pior que a descida, e depois de dirigir várias horas num Corsa sem direção hidráulica, eu estava acabado.

Paramos na casa do Seu Zezão onde ele nos convidou para almoçar. Mas nós estávamos com pouca fome e pedimos uma porção de lingüiça da fazenda. Foi de longe a lingüiça mais gostosa que eu já comi na minha vida. Com uma cervejinha super-gelada. Ela desceu bem à beça. E a farinha? Se vcê for lá, não deixe de pedira pra ver a farinha dele. Uma coisa de outro mundo. Eu enchi a boca daquela paçoca. E tome outra porção de lingüiça. E tome limãozinho galego da fazenda em cima e mais cerveja.

Resultado, quando fomos embora, eu estava meio zoado. No caminho ainda paramos para ir em outra cachoeira.
Subimos mais uma serra e eu já estava como um zumbi. A linguiça da fazenda era forte pra caramba e ferrou meu fígado. Eu sentia uma sede do caramba. Acabei bebendo água da cachoeira (várias vezes)

 
 

Voltamos para a pousada e tudo correu bem. Só o carro que ficou um NOJO.

No dia seguinte, fomos visitar uma fabrica de chocolate, onde a Nivea enfiou o pé em uma lagarta urticante que eu pensei ser uma taturana. Por sorte, não era, e o pé dela queimou como fogo por pouco tempo.

Quando chegou o dia do Reveillon enfiamos as roupas novas e fomos para o centro de Mauá jantar e esperar a queima de fogos.

Quando terminamos de jantar, a Nivea foi ao banheiro e eu fiquei do lado de fora do restaurante esperando. Mulher sempre demora no banheiro. Foi quando eu vi uma multidão que cercava uma pessoa. Pensei que era um artista da Globo, mas qual nçao foi a minha surpresa, quando me aproximei e vi que a “celebridade” era uma MULA?

Sim, uma mula. Ela se chama Rosinha e ao que parece, é mesmo uma celebridade da cidade de Visconde de Mauá. A mula entrava nos restaurantes e o pessoal dava pinga pra ela beber. Sempre cercada de pessoas tirando fotos e rindo. Depois eu vi em várias lojas vendendo camisetas com a estampa da tal mula Rosinha.
Os fogos enfim estouraram, e nós voltamos para a pousada. No dia seguinte, saímos cedo e depois de um café reforçado, metemos o pé na estrada de volta. Passamos em Penedo onde visitamos a casa do papai noel e tomamos o sorvete norueguês. O problema é que enchemos as cumbucas de sorvete e na hora de pagar, “só aceita dinheiro” e nós não tínhamos mais quase nenhuma grana, porque lá em cima em Mauá não tem banco. A gente achou que aceitasse cartão, mas não aceitava e então a Nivea tentou ir no banco 24h de penedo para pagar a conta. Mas o banco estava fora do ar. Puts, maior micão. A dona resolveu aceitar um cheque meio a contragosto e demos no pé.

No meio do caminho pegamos um desvio e fomos até Três Rios para visitarmos a minha vó. Chegamos de surpresa e nos assustamos ao ver a casa toda fechada. Parecia uma reedição da minha aventura “com ou sem”, mas logo depois, quando já estávamos quase desistindo, a minha vó acordou de seu sono pesado e abriu a casa.

Ficamos dois dias lá na casa da minha vó contando piadas e rindo muito, mas para meu azar (e da primeira dama) comemos alguma coisa que não bateu legal. Resultado, a noite de hoje em um belo vômito duplo e uma diarreia que mais parece água de arroz.

Estávamos (estamos) os dois ferrados, vomitando e com diarreia. Achei que ia vomitar até o meu espírito e evacuar meus próprios intestinos. Parece que levei uma surra. Tudo no meu corpo dói. A primeira dama tendo desmaios.

Pra piorar, entra uma barata gigantesca voadora e dá vários rasantes perto da cama. A primeira dama começa a gritar e eu movo meu esqueleto combalido em direção ao sapato e começo um belo balé acrobático tentando matar aquela coisa do capeta. A barata correu para debaixo da cama e eu estava tão pregado, tão exaurido de vomitar e fazer xixi pelo fiofó que liguei o foda-se afinal, barata também é um animal.

Depois de uns três minutos, a porra da barata decolou novamente e repete-se todo o parágrafo anterior. Dessa vez ela pousou perto da janela e eu consegui jogá-la para fora com meu sapato.

Foi uma noite do cão. Estou passando um mal do caramba, acho que vou vomitar e tem algo fazendo um barulhinho muito aprazível na minha barriga. Pra piorar, já tínhamos combinado com a minha comadre de que a minha afilhada e a irmã vão passar o dia aqui em casa. Eu adoro quando elas vem passar o dia aqui, pois nos divertimos muito. Mas eu tinha que ficar ferrado logo hoje? Isso significa que receberei 1001 ordens da primeira dama para arrumar isso, guardar aquilo, largar este blog e ir brincar no play com as crianças.

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Philipe Kling David
Philipe Kling Davidhttps://www.philipekling.com
Artista, escritor, formado em Psicologia e interessado em assuntos estranhos e curiosos.

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Comentários

  1. Eu notei que seu blog estava sendo atualizado no fim de ano!! rsrsrs Vc salvou minha pele hehehheehhe A praia tava uma merda, a única coisa que eu pude fazer foi correr para a primeira lan house que achei e entrar no mundogump :P
    Parabéns, feliz ano novo!

  2. Philipe,

    Hoje tava na boa aqui no trampo,fazendo hora e esperando o tempo passar (e como tu disseste bem,nunca passa),acabei aportando no Mundo Gump,e omo várias pessoas inteligentes já fizeram,joguei na minha lista diária de Favoritos…
    Cara,eu me diverti A RODO com os teus causos,tu mandas muuuuito bem,meus parabéns,e agora já fiquei viciado…Azar do meu chefe,hahahahahahaha !!!!
    cara,toma cuidado pra essa diarréia não ser o início “Taenia Solitaria”,mais uma reencarnação do mal…(Foi o primeiro “causo” que li,sob sua recomendação,hehehehe)
    E como dizem aqui no Sul,um forte quebra-costelas a ti e à primeira-dama,muita água com limão,e te cuuuuida,guri !!!!!

    Mário Buzian – São Leopoldo/RS

  3. Aê Philipe,apesar de tudo,ganhou novo leitor,esse aí de cima =)
    Espero também que não seja o replay do causo da solitária rsrs
    Vê se fica melhor logo ;)

  4. 1) Estimo melhoras!!!!
    Tenta aí um soro caseiro pq do jeito q vc e 1ª dama estão perdendo líquidos é capaz de desidratarem.

    2) Salivei de inveja da sua pequena expedição.. amo viagens q incluem passeios c/ alguma aventura.. geralmente acontece alguma coisa engraçada..seu caso Seu Zezão.

    AAAhn pinga c/ mel é mt bom.. deveria ter ido no palpite do Seu Zezão.

    Falei mt.
    Tchauuu

  5. noossa, melhoras pra vocês!

    aaarh, esse post me lembra a viagem que fiz há pouco tempo pruma serra aqui perto, andamos um bucado debaixo do sol de meio dia, descemos a trilha, chegamos na cachoeira….e voltamos ¬¬
    ninguém merece chegar tão perto pra não poder tomar banho.. aaamo cachoeira :~

  6. Muito cômica essa aventura Philipe
    Depois podia postar algumas fotos das cachoeiras!
    Pior eu que não saí pra lado nenhum e também peguei uma virose macabra estilo a sua. (Espero que já estejam melhores) Bom ano novo

  7. Já tô bom. Fiquei de molho ontem o dia todo deitado estiradão e hoje acordei zerado. Parece até que eu fiz um defrag de fim de ano, jogando tudo que nao prestava no meu Hd fora, hehehe.

    A vantagem é que eu perdi quase 2kg. As calças estão caindo.

    Vou colocar as fotos neste post. É que ontem eu estava morto e acabei de escrever o post, corri para a cama.

  8. Olá!!!
    Bem que lindo passeio e desgastante. Agora o final foi fechado com chave de ouro ou melhor de merda!!! Mas acontece nas melhores famílias. Você bem conhece a minha história, mas está proibido de contar aqui.
    Mas com diarréia ou sem valeu apena, heim?
    E espero que esteja agora se divertindo com as meninas…provavelmente vocês estarão na piscina porque o calor está de matar.
    Um feliz 2008 para vocês.
    Erika

  9. [quote comment=””]Ah, agora deu vontade de contar. Hahahahaha
    E aí leitores? Vocês acham que eu devo contar a aventura da Érica ou não?[/quote]

    Conta!! Ela liberou :D

  10. pow.. legal cara!!!
    Fui pra visconde de mauá há uns 3 meses… fiquei 1 semana rodando as cachoeiras…
    é um ótimo lugar pra se descansar…
    alugamos uma casa no meio do mato… éramos 4 amigos e 3 amigas…
    se quiser tenho bastantes fotos do lugar…
    é uma boa por pra galera ver o tanto q o lugar é lindo!!!
    devo ter umas 300 fotos de la!!!

    abraço

  11. [quote post=”1548″]Que vida boa hem?

    De vez em quando é bom tirar umas férias de tudo ,
    né Philipe?

    Abração e tudo de bom[/quote]

    Pode crer. Estive me preparando mentalmente para ralar muito em 2008.

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