Planeta dos macacos: Festas de gente e de cachorro no Brasil

Me lembro que certa vez um estrangeiro que estava morando no Brasil resolveu escrever suas impressões sobre nossa famosa “pátria amada”. Uma das coisas que ele dizia que chama muita a atenção de um estrangeiro aqui são as festas infantis. De fato, se olharmos para os aniversários de crianças do mundo sob a ótica dos brasileiros, tudo será EXTREMAMENTE MIXURUCA.

Talvez por isso, o estrangeiro aqui comparou os aniversários infantis brasileiros com uma COROAÇÃO ROMANA. Certamente, o estrangeiro, como não está ainda imerso no caldeirão cultural que forma o brasileiro, não tem a compreensão dos elementos que permitem destrinchar esse comportamento peculiar.

 

As festas infantis e suas implicações sociais é um tema tão interessante, que se eu fosse antropólogo, mergulharia de corpo e alma nisso, mas eu sou só um blogueiro psiconerd, de modo que já peço sua complacência antecipada pela minha rasa capacidade de análise.

Soa curioso que um povo que vive reclamando que nunca tem dinheiro para nada consiga produzir festas (em alguns casos anualmente) dignas de figurar entre celebrações da realeza.

Muitas pessoas, passam o ano inteiro juntando dinheiro para poder queimar toda essa imensa economia num único dia. Aos olhos de um estrangeiro, tal comportamento não faz O MENOR sentido, e se analisarmos friamente, só pelo aspecto logico, não faz, de fato.

Pra quem?

As festas brasileiras, sejam infantis, de idades marcantes nos adultos, como 18, 30, 40 e 50 anos, casamento, batizado, chá de bebê ou qualquer outra celebração em que se gaste pra valer, estão aí. São algo ao qual nós constantemente somos convidados, e muitas vezes nos espantamos com os requintes e com o “capricho” com o qual são realizadas.

Muitas vezes, podemos nos perguntar, afinal, isso tudo é para aquela criança mesmo? Só pra ela? 

A resposta, caso você esteja em dúvida é sempre NÃO. Não fazemos nunca NADA apenas por uma razão. Desculpe aí se te jogo um balde de água fria, mas TODAS as ações que você toma na sua vida, seja comprar seu carro, casar, mudar de apartamento, ou mesmo a escolha da roupa com o qual você vai trabalhar obedece em primeiro lugar, sim, à sua vontade, mas há um peso inconsciente, que muitas vezes se materializa na forma de um discurso. Tal qual a roupa matadora e o batom vermelho berrante, pinçados no meio de milhares de outras possibilidades, TUDO na nossa vida pode ser interpretado sob a ótica de um discurso. O lado bom é que poucos estão capacitados para ler o discurso e refletir sobre ele. E muitos, talvez a ampla maioria, vão “comprar” o discurso.

Não é nada malignamente calculado. As pessoas, como eu disse, em geral, fazem isso inconscientemente. Muitas vezes, o aniversário, o vulgo-rega-bofe, a festança é além de um discurso, uma autoafirmação de poder, um “sinal social”.

Sinais sociais são informações que um ou mais indivíduos projetam para o grupo. Pense na sociedade como uma enorme árvore cheia de macacos. Cada macaco ocupa um galho dessa árvore, e existem, é claro, os galhos bons e os ruins. Quem é o macaco que deve ocupar um galho bom?

Eu não sei. Considerando que todos são macacos, eu diria que todos deveriam poder ocupar um bom galho, mas é fato que uma árvore não pode existir apenas com galhos bons, o que nos leva à triste constatação que  para cada macaco num galho bom, deve ter uns cem macacos em galhos bem ferrados, alguns quase ao ponto de se quebrar, outros em galhos com espinhos, com formas bizarras e galhos escorregadios… Na inexorável disputa pelo melhor galho, eu diria que o macaco que vai ocupar o lugar desejado no grupo é o que tem o “poder”.

O poder no universo de macacos numa árvore pode ser expresso por FP, ou “fator porrada”.

O macaco que dá mais porrada é o mais fodão, e por isso, o mais poderoso. Os macacos não tem dinheiro, e sua estrutura social complexa, lembra a nossa. Desse modo, os melhores galhos estão com os macacos bons de porrada, mas há galhos intermediários, que são galhos onde um macaco se sentiria bem mais feliz que num galho merda, mas ainda ambicionaria o galho bom onde, para seu azar,  já está um macaco bom de briga e mais forte que ele.

Como esses galhos serão ocupados? Sorteio? Democracia? Logico que não. Os macacos que ocuparão os galhos bons, logo abaixo dos ótimos no padrão de qualidade “macacal”, serão aqueles que conseguirem se garantir com quem tem o poder. E como eles fazem isso?

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Levando comida para o macaco forte, oferecendo SEXO para o macaco forte e tentando de todo jeito sistemas de COALIZÃO social para que unidos tenham poder reconhecido pelo macaco forte que os garanta a proximidade com o poderoso.

Coalizão é quando mais de um macaco se junta num grupinho ou o que muitos chamam de “panela”.

E é assim, meus amigos, que se estrutura o que sempre chamamos de côrte.

Você lê muito essa palavra nos livros de História, mas a côrte não sumiu com a modernidade. Ela apenas ficou mais modernosa e como nós ESTAMOS NELA, pouco acabamos pensando sobre ela. O interessante da corte é que num universo sistêmico, existem diversas delas. Certamente na sua sala de aula da escola devia haver uma corte. Na sua escola pode haver uma ou mais, e não duvido que elas também se estruturem numa árvore de cortes, como galáxias, todas se influenciando em maior ou menor grau.

Os macacos na árvore estão em permanente mutação. Eles nunca ficam no mesmo galho por muito tempo. Alguns ficam. Outros sobem para galhos melhores à medida em que obtém poderes, ou oferecem ao detentor do poder, o manda-chuva, algo que os destaque no grupo social. Alguns, ou melhor, muitos, estão se fodendo, caindo da árvore o tempo todo. E há macacos morrendo, nascendo e até chegando de mala e cuia vindos de outras árvores,( um macaco gringo) tentando entender como se estrutura o diagrama de poder em uma nova árvore, até pra saber se vai se encaixar melhor nessa nova do que estava na árvore de onde ele veio.

Desse jeito, a árvore dos macacos é uma confusão medonha de gritos, gemidos e porradas. É um fuzuê, uma esculhambação insana onde leva tempo para entender o que realmente se passa nas linhas, que dirá nas entrelinhas. Há grupos tentando o tempo inteiro virar os donos da árvore, de modo que ser o chefão é uma função temporária, que depende não somente da porrada, mas das coalizões que o líder precisa fazer, senão os macacos mais fracos se juntam e te chutam da árvore. Inclusive os macacos que até ontem juravam amor e fidelidade eterna.

Macacos são foda, você sabe…

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Nesse fuzuê perpétuo, os macacos ficam emitindo sinais sociais o tempo inteiro. Há sinais que tem objetivos claros: alguns servem para INFORMAR O GRUPO quem é aquele macaco. Por exemplo, se o macaco levanta e soca o peito para fazer barulho, ele está dando um sial social de que é bom de porrada e por isso merece o respeito.  Mesmo que cada porrada daquelas quase mate-o de dor, ele precisa dar aquelas porradas porque não basta aguentar a trozoba que é defender seu galho, é preciso mostrar o tempo inteiro que aquele galho que você ocupa na árvore dos macacos é o seu quinhão conquistado pelo seu poder!

Quando o macaco está num galho ao qual ele acha que não é o que ele “merece nesse mundo”, ele tem algumas opções: Ele tenta lutar com um macaco mais fraco que esteja num galho melhor, e que não mereça ou não se garanta socialmente o suficiente para permitir que seu galho não seja tomado pelo invasor. Ou ele pode se aliar a um coletivo de outros macacos fodidos na dinâmica social e começar a fazer barulho, começar a aporrinhar tanto, mas tanto, que o macaco detentor do poder máximo lhes dá atenção e chuta alguns macacos do meio de campo que ele despreza para que aguentem o coletivo um pouco mais acima.

Certamente isso “vai dar ruim” no mundo dos macacos. Sempre dá. Uns gritam querendo subir, outros gritam que não querem descer. No fundo todo macaco só se preocupa em garantir seu galho bom e buscar um ainda melhor para seus filhos.

Esqueça os macacos

Se nós, macacos que já não dependemos de árvores nem galhos para viver temos algo em comum com os parentes peludinhos que citei aí no post são essas nossas complexas redes de relações sociais. Tal qual eles, nós damos sinais sociais o tempo todo. Quem não vai reconhecer aquela camiseta cara na boate como um sinal social? Qual a função dela? Vestir. Mas só vestir? Claro que não. Ela tem um papel nessa dinâmica a que me refiro que são a montagem da nossa persona, a forma como nos colocamos no mundo. A forma como nos apresentamos. Na nossa “árvore”, dinheiro e poder é a mesma merda. Aqui, cheio de leis e regras nem sempre vale a vontade de quem dá mais porrada, mas é certeza que como diz  senso comum, “o Brasil é paraíso para quem tem dinheiro”.

O sinal social de exibir seu poder de consumo é uma necessidade tão brutal que nós temos os carros populares mais caros do mundo. Por que? Imposto? Não, porque “o brasileiro paga”. O desejo do sinal social é um imperativo nessa nossa árvore, porque mais que em muitos países, na nossa árvore, desde sua constituição, o que pesou na relação de poder sempre foi a “fidalguia”. Você é um fidalgo, ou em português mais claro: “Filho de alguém”.

Quem é essa alguém? Não sei, mas todo mundo gosta de parecer que esse alguém manda. Afinal, sabe como é. Quem nunca viu uma pessoa contrariada estufar o peito e meter o clássico “sabe com quem está falando?” Não raro, vemos isso acontecer com filhos de políticos investigados por suspeitas de maracutaias mais diversas.

Há um deslocamento de poder social, que é outra coisa bem interessante de observar. Por exemplo, se você é um macaco sem muito prestígio na árvore, mas você tem os amigos certos em sua micro coalizão, isso te torna mais forte. É como ganhar poder por osmose. Assim, no Brasil, nem sempre ter poder é sinônimo de riqueza. Muitas vezes ter os amigos certos pode dar mais poder social que ter o dinheiro apenas. Novamente, basta recorrer ao noticiário para ver que “amigos” dos influentes orbitam os grandes centros de poder da nação o tempo inteiro.

Assim, a festa é ao mesmo tempo uma declaração do poder, um sinal social que confere ao dono da festa seu lugar no extrato e ao mesmo tempo é uma convenção, uma reunião de indivíduos numa coalizão, num grupo social. As festas, desde os tempos imemoriais dos reis primitivos sempre tiveram essa função de construir laços e fortalecer os já existentes, num emaranhado de poder e “conhecimento”. Nunca o “diga-me com quem andas e te direi quem és” foi tão apropriado. Ditos populares tem a especial capacidade de catalizar as grandes verdades da vida.

É com base nesse contexto, que uma festa de cachorro chama tanta atenção. Quando se trata de aniversário de criança, o sinal social pode ser confundido com uma declaração publica de afeto pelo filho, a justificativa de onze entre dez pais que gastam os tubos na festa do filho (eu incluso). Mas um cachorro? Um cachorro, oferece um controverso sinal social: Alguns podem ver aí uma tentativa de ostentação, de “reidocamarotizar” a festa, querer como dizem, ser “mais real que o rei”. Uma festa de padrão humano para um cão também é de certo modo antropomorfizar o animal.

É elevá-lo ao status de filho, e isso desagrada muitas pessoas. É porque quando se trata de um cachorro, fica mais evidente o exagero, na medida em que o cachorro não teria capacidade de avaliar que uma festa é exagerada ou não. A medida do sucesso na mente de um canídeo é tão somente o que tem pra comer e quantas bundas ele poderá cheirar no dia.

As fotos da festa do cachorro:

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Impressionante, não?

“Festas nababescas” são batizadas assim em homenagem ao antigo rei da Babilônia, Nabucodonosor, que certamente devia dar umas festinhas do balacobaco! Animais de companhia sempre desfrutaram de grande prestigio com os monarcas, e talvez aqui esteja mais um pequeno sinal social. Quem  faz uma festa de palácio para o cão que é a “sua princesa”… Quer realizar sua fantasia de ser a rainha?  Provavelmente.

Mas é muito possível que a festa para o cão seja a desculpa social para se permitir a festa infantil que desejou uma vida inteira e nunca pode efetivamente ter. Eu esperaria isso de uma mulher que amargou uma patética inauguração social chamada “festa de quinze anos”. Décadas depois, num galho melhgor da árvore, as coisas se tornam possíveis, mas o cão catalisa essa viabilidade.

Não é uma coisa ou outra. Aqui há muitas possibilidades que se coadunam.

Animais de companhia sempre despertaram ódio quando recebem afeto demasiado dos detentores do poder. Não é de hoje que alguns animais recebem heranças milionárias. Duvida?

 

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Talvez um dos mais famosos animais a ter mais “moral” que muita gente foi Bucéfalo, o cavalo de Alexandre, O grande.

Alexandre era absolutamente apaixonado por Bucéfalo, ao ponto de exigir ser retratado com ele em quase tudo que dizia respeito à suas glórias.

battleofissus333bc-mosaic-detail1Foi pago pelo animal o impressionante valor de 13 talentos gregos, o que equivale hoje a cerca de 350 kg de ouro (1 talento grego = aproximadamente 27 kg de ouro).

Bucéfalo permaneceu como a fiel montaria do conquistador ainda por muitos anos, tendo morrido em batalha enquanto ele e seu cavaleiro enfrentavam brigadas de elefantes montados no que hoje é o Paquistão.   Bucéfalo foi enterrado com honras militares superiores a muitos generais. Mas não apenas isso! Alexandre enterrou o garanhão, mandou erguer um tumulo escalafobético e, no entorno do local da sepultura, fundou a cidade de Bucéfala em homenagem ao seu velho companheiro.

Coroações Romanas

Na grande maioria dessas super festas, tudo remete a consumo e muitas vezes, desumanização. Modismos bizarros como chuva de borboletas congeladas, pirofagia e aniversário em limusine. A alta demanda por festas que destaquem seus donos na “multidão” produzem novos mercados. As  festas, sobretudo nas nas classes médias e elites, se tornaram objetos de uma corrida pela estupefação alheia. Eu diria que o céu é o limite, se eu não soubesse que o limite mesmo é o bolso. Quem não se lembra da festa da Sasha de um ano? Tinha até um quiosque do Mc Donald´s no jardim da Xuxa!

Hoje as festas infantis começam em aproximadamente R$ 2,5 mil e chegam até a espantosas somas de dezenas e em poucos casos, centenas de milhares de reais. Casamentos então… É uma loucura. Eu já fui em casamento que só o ALUGUEL do salão custou mais caro que um apartamento.

O fenômeno da festa infantil é intrigante porque foi uma mudança brusca nos hábitos da classe média. As pessoas de classe média, em geral, almejam pertencer às classes ricas, num mecanismo que já expliquei pela metáfora árvore dos macacos. Ao que parece, os sinais sociais se tornaram tão necessários à classe média que isso provocou uma gradual desumanização da própria festa.

Em muitas festas infantis, há poucas coisas que remetem ao aniversariante. A começar pelo ritual do presente. Geralmente, pessoas dão presentes às outras como sinal de apreço. Esse presente é dado no aniversário, mas em muitas festas, ao chegar, você se depara com um baú onde deve “depositar” o presente. Não há mais o ritual do presenteamento, da homenagem e do tributo social (pense o presente como um macaco dando uma banana ao outro como reconhecimento pelo seu lugar na árvore e pelo fortalecimento do elo entre os dois macacos amigos). Sem o ritual, o presente se torna um mero tributo, uma exigência da mecânica do evento. Muitas vezes, a festa ocorre em horário em que a criança dorme. Não raro, passa a própria festa inteira dormindo e chora na hora do parabéns.

Um aniversário é um conjunto sistemático de micro-rituais sociais complexos, que se ordenam de modo específico.   Há partícipes desse ritual que desempenham papeis especiais. Uns são animadores, outros garçons, e entre muita gente, há os personagens vivos, operadores de “brinquedos”, monitores, e fotógrafos e cinegrafistas. Desse modo, há todo um circo montado, um circuito do qual o aniversariante e seus pais dificilmente conseguem prescindir, e que tornam, a festa em certos casos, uma espécie de prisão. A criança aniversariante dificilmente tem paz para se divertir, entre fotos e pessoas mexendo nas roupas para ajeitar.  A mecanização do processo chegou a tal ponto de se estabelecer a “hora de comer” no meio da festa, onde praticamente para tudo e todas as crianças são levadas a um pequeno banquete, geralmente meio corrido, porque o circuito envolve muitas ações e atividades.

O mercado dos modismos precisa de novidades permanentes. Assim, bufês infantis foram se modernizando e ganharam novos conceitos que acompanham as tendências das classes mais favorecidas, tais como alimentação mais light, sucos verdes, brigadeiros gourmet, brinquedos mais orgânicos, brindes inovadores e decoração ligada à natureza, dando um novo molde ao consumismo, não negando sua existência, mas confirmando sua permanente mutabilidade.

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Não sei bem de onde veio a ideia das festas sobre rodas. Talvez do culto à personalidades, do desejo de ser influente massificado já na infância. Quando eu era criança, queria ser u Super-Homem, o Spectreman. Hoje os meninos querem ser o Felipe Neto ou o (_____________ espaço destinado ao seu youtuber do coração), ter milhões de seguidores, que digam a ele que ele é foda o tempo inteiro, de corpo e alma, pelado e vestido.

É como o macaco do galho bom: Bate no peito porque não basta estar no galho, é preciso que toda a árvore o veja ali, e deseje estar ali para que ele se sinta justificado em sua existência.

E é justamente daí que também nasce o desejo de ostentar até quando você não tem condições para tal.

Ostentar é preciso, e as limusines são um ícone da suposta importância autobajuladora. Daí que meninas entre 6 e 11 anos, das elites de grandes centros urbanos, começaram a cobiçar festas que acontecem dentro de limusines alugadas a peso de ouro pelos pais. Muitos se vêem na estranha condição de precisar prover os filhos daquilo que os colegas todos tem, sob o risco da criança não ser mais bem vista no grupo. E na floresta dos macacos, como dizem, o grupo não é tudo, mas é 100%!

Após dias de princesa em Spas e clinicas de estética as aniversariantes adentram os carros alugados por milhares de reais para festejar mais um ano da vida, confinadas no trânsito de grande metrópoles como Rio de Janeiro e São Paulo – ao som ensurdecedor de celebridades mirins e ao sabor de doces e refrigerantes.

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Um aspecto interessante que vejo na festa da limousine é sua peculiar limitação. Sem espaço de sobra, uma festa na “Limo” se torna um evento automaticamente excludente. O que parece um curioso contraponto moderno ao conceito da festa como elemento da coalizão. Tudo nos leva a crer que uma festa na Limo sirva como delimitador de um círculo de importância onde quem ta fora quer entrar e quem está dentro não quer sair. Assim, a limousine mais que apenas um carro cheio de papagaiada, é uma materialização consumista do galho bom. Ela constrói uma metafórica ponte levadiça que separa os nobres dos plebeus nas relações sociais.

A festa pode esgotar-se ali mesmo, mas em muitos casos, ela extrapola a ponte. A “carruagem” moderna leva toda a corte para a celebração num castelo, que pode ser metafórico ou literal. Em geral, é uma boate, onde o pequeno e seleto grupo exercitará o consumismo, valores materialistas e a sexualidade precoce.

O sucesso dessas festas foi tão grande que a moda se reinventou e hoje atinge o público adolescente e o adulto com as famosas Festbus, que acontecem dentro de ônibus – transformados num grande salão de festas com pista de dança itinerante. No fundo, o mesmo mecanismo do galho bom, onde os macacos importantes podem se reunir, separando-se da ralé.

É a construção permanente do nós e eles no planeta dos macacos.

 

 

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Philipe Kling David
Philipe Kling Davidhttps://www.philipekling.com
Artista, escritor, formado em Psicologia e interessado em assuntos estranhos e curiosos.
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Comentários

  1. Há um ano e pouco atrás tive esse mesmo “insight” sobre a função “social” de se dar uma festa extremamente cara e sem retorno, ao menos, financeiro… porém vaidade, e ostentação social são talvez mais importantes a quem dá esse devido valor.
    Jà dizia o Eclesiastes: tudo é vaidade, e vento que passa… cuidado.

  2. Engraçado que espelhamos o nosso comportamento de maneira muito fidedigna ao dos nossos parentes símios, claro, com muito mais camadas e de complexidade muito maior, mas no fundo, são ecos da construção da sociedade de nossos parentes e ancestrais…
    Pelo jeito não tem muito para onde fugir ou mudar, seremos sempre macacos!!!

  3. Gostei bastante do tema abordado, sempre pensei isso de festas, desde criança ficava incomodado com festas de parentes e como eram visivelmente distantes da realidade das pessoas. E isso é muito comum, as pessoas preferem gastar dinheiro em festas para seus filhos do que investir a mesma quantia em uma poupança para pagar estudos.

  4. O brasileiro elitizado financeiramente nem sempre é dotado de inteligência suficiente para notar que um cão está cagando e andando literalmente para uma festa dessas. Ter dinheiro não é a condição para ter plena felicidade e realização pessoal. Ajuda em muitas coisas é claro. Mas as vezes por falta do que fazer com ele as pessoas inventam coisas tão bisonhas que mereciam uma punição moral num país onde grande parte população é ignorante ao ponto de se divertir com algo dessa natureza. Estamos num tempo de fetichismo extremo que envolve animais e objetos que foi culturalmente importado da cabeça capitalista americana. Que prega que o importante e ter dinheiro e fazer a merda que quiser com ele. Muitas dessas pessoas morrerão sem o prazer de um contato real com outras pessoas, de passar um dia no mato, ou seja de admirar coisas simples e pessoas. Estão num mundo comprável e sintético.

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