A história de Clementino Firmino da Silva

Clementino Firmino da Silva nasceu em 1968. Ele começou a trabalhar aos quinze anos, ajudando o pai, lavrador em Parintinga do Norte. Quando fez 18 desistiu daquilo tudo. Não era a vida que ele desejava. Clementino sempre quis era ser o Pelé.
Ele viu o Pelé pela primeira vez num raprise já toda carcomida do canal 100 que passou numa exibição na parede da igreja no dia de Santo Antônio.
Desde então, ele quis ser o Pelé. Clementino era assim.
Encasquetava com uns troços e pronto. Danou-se!

Clementino acordava às cinco quando o galo ensaiava seu primeiro canto e na escuridão da casa, desviava dos oito irmãos menores que dormiam pelo chão. Ele sempre estava com sono porque dormia tarde, pensando no Pelé. No maracanã lotado. Nos gritos ao seu redor. Nas glórias. Nos amigos pulando sobre ele para comemorar aquele gol sofrido de copa dop mundo. E nesse tempo em que aquele filme passava na cabeça dele, Clementino via a fraca chama da lamparina bruxurilar pelas formas toscas do barro das paredes fazendo sombras engraçadas. Em noite de lua ele esperava com os olhos ardidos até que a luz alaranjada da chama tornava-se azulada pela lua que entrava como um jato pela janela.
Logo depois, assim que o primeiro sonho corria no interior de seus olhos fechados, ele sentia o toque da enxada do pai em seu braço. E em meio ao barro das paredes e ao fraco cheiro da fuligem que ainda exalava da lamparina de querosene já apagada, ele sonhava.

E então a história de Clementino ganha um novo ar de aventura quando ele encontra um canivete bem bonito na porta da igreja.
Era dia de domingo e antes do futebol, foram todos à missa. Clementino saiu para urinar e deu de cara com aquela coisa. Estava ali, caído ao chão como se propositalmente colocado para que Clementino o apanhasse. De tal modo que o gartoto ainda olhou para os lados em busca do dono antes de oferecer qualquer movimento na direção do objeto. Mas não havia ninguém.
Minto. Havia o Zacharias do Goró, que estava dormindo no banco da praça depois de beber uma garrafa de cana. Mas ele em seu sono etílico não conta.

Clementino pegou o belo canivete que reluzia ao sol. O cabo de madrepérola e a lâmina de um metal brilhante muito bonito. No cabo, junto a pequena alça de prata de onde pendia uma minúscula correntinha arrebentada as iniciais P.G. estavam gravadas com um bonito desenho de letra. Tão belo quanto aqueles da Biblia Sagrada de sua avó.

A missa já acabava quando Clementino fez a única coisa que resta ao que todo homem direito deve fazer numa situação dessas. Chamou o padre e comunicou o encontro do valioso objeto.
O padre comunicou à paróquia que em silêncio manteve-se. Nenhuma alma viva ou penada surgiu para reclamar o bem. Não aparecendo proprietário, o Padre devolveu o objeto ao jovem agricultor.

Horas depois. Clementino, Bibinho e Andeco jogavam uma bola de meia num campinho de várzea quando um carrão parou ali perto. Do carrão desceu um homem de chapéu e roupa bonita que veio até ele acompanhado do padre.

– Você que é o Clementino?
– Sim senhor. – Disse ele cobrindo os olhos para aquela figura contra a poderosa luz do sol.
O padre adiantou:
– Clementino, meu filho. Este é o doutor Paulo Goulart, dono do canivete que você achou.
– Ah, sim senhor! Ele tá aqui. – Disse o menino correndo até um pequeno bolinho de roupas emboladas. Sob a camisa embolada estava o canivete.
Clementino o entregou ao homem.
Eles se olharam em silêncio por alguns minutos.
O homem enfiou a mão no bolso e retirou dali um maço de notas. Notas tão altas que o padre coçou a testa e Dedeco não aguentou e acabou soltando um “Nossa mãe do céu!”.
Eram bonitas notas novinhas.
A vida mudou naquele dia.
Clementino voltou para casa radiante.
Cheio da nota. Magnata. Dedeco confirmou para os pais incrédulos. A família fez uma festa. Era o dinheiro necessário para que Clementino saísse finalmente daquela vida.

A história de Clementino dá um pequeno salto e agora ele está no ônibus, feliz, sacolejando e pensando no futuro. Vai para São Paulo. Vai virar alguém. Vai vencer na vida e quem sabe, virar o Pelé. Talvez até alguém melhor na arte da bola.

No meio do caminho, o ônibus quebra.
Clementino desce junto com todos os passageiros reclamões.
Eles esperam sob o sol escaldante algum socorro, mas estão em pleno sertão. Não há nenhum carro, nenhum som além do canto dos passarinhos e o rugir do vento. O jeito é esperar o primeiro pau de arara que traz boisas frias surgir para socorrer.
Clementino senta-se no chão. Algo espeta-he a bunda.
Acreditando ter sentado num formigueiro de saúvas, o garoto dá um salto. Mas não.
Há ali apenas uma pequena pontinha brilhante.
Clementino pega uma pedra e futuca o objeto. Ele está firmemente cravado no solo.
Clementino pega um tôco e começa a escavar em volta do objeto.

E então, o que parecia ser uma microscópica pirâmide revela-se uma caixa de metal brilhante enterrada de maneira torta no solo. Um cubo perfeito.
A caixa é pesadinha. Não tem qualquer abertura ou dobradiça, nem mesmo fechadura. È do tamanho de um punho fechado e reflete perfeitamente o ambiente, como se fosse um espelho.
Olhando bem, Clementino descobre um furo pequeno, muito pequeno na parte de cima. Do tamanho de uma agulha.
Clementino olha para aquele estranho objeto tentando entendê-lo. Sacode. Não parece ter nada dentro. Parece ser sólido.

Três horas depois, o ônibus ainda está ali, com o eixo quebrado, a noite começando a cair implacávelmente sobre eles.
Os homens jogando baralho num tôco de árvore, crianças chorando no interior do ônibus torto, e umas senhoras costurando bordados ao fundo.
Foi neste momento que tudo aconteceu.
Começou com a brilhante ideia: Pegar uma das agulhas das senhoras lá do ônibus e enfiar no orifício da estranha caixinha só pra ver no que dá.

Vamos direto ao ponto em que isso acontece. Vou pular toda aquela parte em que ele pergunta se pode usar uma agulha, as mulheres negam, ele implora, elas relutam, e então ele argumenta com elas e diz que vai devolver. Mas antes, Clementino tem que explicar para que vai usar e acaba dizendo que vai tentar abrir uma caixinha que “ganhou de um parente”, despertando enorme curiosidade das velhacas curiosas para saber o que haveria na “caixinha de jóia”.

Pulei. Agora Clementino já está do lado de fora do ônibus capenga. Ele já despistou as coroas e tem numa das mãos a caixa misteriosa brilhante e na outra uma agulha.
Clementino olha com a fraca luz da lamparina do motorista que ilumina o jogo de baralho. O orifício é minúsculo. Ele mira, mira, mira e finalmente enfia a agulha.
E então…

Nada, absolutamente nada acontece.

Nem os grilos param de estrilar, nem as estrelas diminuem seu brilho. Não sai som algum da caixa, ela não se abre, nada. Nem sequer esquenta ou muda seu peso.
Clementino torce e retorce a agulha, girando-a como se fosse uma chave para todos os lados, mas nada acontece.
É frusrante, não é?

Quando finalmente perecbe que nada de diferente vai acontecer, Clementino fica decepcionado.
Mas quando ele tira a agulha do buraco, uma fraca luzinha verde subiu do orifício no objeto em direção ao céu. Subiu em linha, rapido como um raio e contínuamente, como se fosse uma lanterna bizarra.
A coisa até parece um raio laser, mas Clementino, coitado não sabe disso. Ele não sabe o que é laser. Nem faz ideia que uma luz é capaz de seguir em linha reta de modo tão preciso. Só quem sabe isso somos eu e vocês, mas ele não faz ideia de que coisa doida é aquela e acaba com medo jogando o cubo metálico para o alto.
O objeto parece cair com precisão absoluta, enviando para o espaço aquele tênue raiozinho de luz verde, quase invisível. Em seguida apagou. A caixa ficou ali parada por uns segundos.
E então sumiu.
Clementino cheio de arrepios, correu para o ônibus e tentou dormir apertando firme os olhos.

FIM

Ok, ok, fim nada. Vou contar o que aconteceu depois:
O raio de luz estruturada cortou a dimensão real e subiu numa linha reta escalar direto para o cosmos, atravessou o sistema solar e acertou em cheio Júpiter. Mas logo depois, saiu pelo outro lado do enorme planeta e percorreu seu longo caminho através da galáxia, escapando desta, passando por mais duas e enfim mergulhando no vazio onde passou de raspão em dois planetas gigantes escuros, indo parar numa massa de gás superdenso. O raio percorreu o infinito aglomerado de gás e atingiu em seguida uma estrela gigante vermelha. O raio provocou uma instabilidade grave no núcleo do astro, que explodiu, gerando uma supernova, mas tamanha explosão afetou o tecido do espaço-tempo o que gerou um buraco negro.
Mas o buraco negro está bem distante e o fabuloso raio verte finíssimo continua seu vôo pelo universo, entrando em duas, tres, quatro, galáxias até colidir com uum diminuto planetóide num sisteminha binário chamado sistema VA.

É o período de migração dos vateks, quando de cem em cem anos VATS, os machos vateks caminham oito mil quilômetros em busca das fêmas. Mas como o sol do sistema VA, uma estrela brilhante muito, muito distante começou a brilhar cada vez mais forte, eles não irão migrar. Os vats serão na verdade extintos antes que possam desenvolver alguma consciência disso. Sua galáxia começa lentamente o bailado cíclico em direção ao ralo do espaço tempo que tragará todo seu sistema solar duplo.
Todo o conhecimento, arte e filosofia Vatek serão destruídos e ninguém, absolutamente ninguém, em lugar algum no passado ou no futuro, em lugar nenhum, saberá nada sobre eles.
Mas antes disso acontecer, um pequeno Vatek que estava do lado de fora de sua toca colhendo Niggons encontra uma pontinha prateada no meio dos niggons.
Ele retira o objeto com cuidado e descobre que trata-se de um estranho cubo prateado com um minúsculo furinho num dos lados.
Neste momento, o jovem Vatek tem uma brilhante ideia…

FIM

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Philipe Kling David
Philipe Kling Davidhttps://www.philipekling.com
Artista, escritor, formado em Psicologia e interessado em assuntos estranhos e curiosos.
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Comentários

  1. Caraleo. Você que escreveu isso?
    Se sim, você tem umas idéias muito boas e escreve muito bem, além de ser louco.

    Puta merda, que final maldito.. Fiquei torcendo pra ter Cesio 137 dentro da caixinha de metal do Clementino… damn!

    Mto boa historia.

  2. VAleu galera. Eu que escrevi sim.
    Tava com saudade de postar algum texto de ficção científica. Um leitor do blog me escreveu para falar sobre ficção científica e eu acabei resolvendo escrever alguma coisa nesta linha.

  3. Fernando, cabe tuod no Mundo Gump. MAs o mundo gump não pode ser um blog exclusivamente sobre a minha vida, saca?
    Mas em homenagem a você, postarei uma aventura real minha.

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